sexta-feira, 4 de novembro de 2011

ICAR – JESUS TINHA IRMÃOS? MARIA PERMANECEU VIRGEM PARA SEMPRE?


Se Lutero só aceita aquilo que está claramente estabelecido nas Escrituras, por que ele acredita na virgindade perpétua de Maria? Não há nada que a prove nas Escrituras e, na verdade, Helvídio tomou para si a tarefa de provar o contrário dependendo apenas da autoridade Escritural.
Thomas More, canonizado em 1935 pelo papa pio XI. Em: An Answer to Martin LutherThe Essential Thomas More. 1967. p. 112.[i]
Dentre os dogmas da igreja católica apostólica romana (ICAR) que dizem respeito à Maria mãe de Jesus, vários carecem de base nas Escrituras e por vezes chegam até mesmo a contradizê-las seriamente. Um deles é o de que Maria, uma mulher casada (e não uma deusa casada!), permaneceu virgem durante toda a sua vida.
Afirma-se no catecismo nº 501 que “Maria tem um único filho”, ou seja, Jesus. Logo, de acordo com os dogmas da ICAR, não se pode admitir que ela tenha mantido relações sexuais com José, seu marido, e gerado outros filhos. Ainda se afirma no cânon 2 do segundo concílio de Constantinopla:  Se alguém não confessa que há duas concepções do Verbo de Deus, uma antes dos tempos, do Pai, intemporal e incorporal, e a outra nos últimos dias, concepção da mesma pessoa, que desceu do céu e foi feito carne por obra do Espírito Santo e da gloriosa Genitora de Deus e sempre virgem Maria, e que dela nasceu, seja anátema[ii].
Também é importante conhecer a opinião da ICAR sobre as relações sexuais, mesmo quando se dão no casamento, como se pode ver na sessão 24, cânon 10 do concílio de Trento: Se alguém disser que o estado matrimonial deve ser colocado acima do estado da virgindade ou do celibato, e que não é melhor e mais abençoado permanecer em virgindade ou em celibato do que se unir em matrimônio, que seja anátema[iii].
Normalmente o texto Bíblico utilizado para se justificar isso está em 1 Coríntios 7:25-40. Porém note que logo no início (v. 25) do trecho Paulo deixa claro que está dando sua opinião e não um mandamento do Senhor, ademais, trata-se de uma mensagem específica para uma comunidade com diversos problemas (v. 26 e 28), não necessariamente um dogma a ser seguido por todos os Cristãos e em todos os contextos. Se por um lado um solteiro está livre para se dedicar exclusivamente à obra de Deus, um casado tem a oportunidade de servir ao Senhor dentro do casamento, constituindo uma família Cristã, dando bom testemunho e aplicando os princípios Divinos na resolução de conflitos, educação dos filhos, finanças, vida profissional e etc. Assim, é impróprio criar dogmas nos quais se elevam os clérigos da ICAR em detrimento das outras pessoas. Especialmente se levarmos em conta que Deus diz: “Não é bom que o homem esteja só; farei para ele alguém que o auxilie e lhe corresponda” (Gênesis 2:18). Vemos então que a Bíblia não se contradiz, mas sim que magistério de Roma errou ao interpretá-la com o intuito de justificar seus dogmas.
Tendo isso em mente, os objetivos deste artigo são mostrar que, de acordo com a Bíblia, a melhor interpretação é a de que Maria teve filhos com José, logo, não permaneceu virgem para sempre, ou seja, mais um caso no qual as doutrinas e os dogmas de Roma entram em contradição direta com as Escrituras. Vejamos então:
O SEXO NO CASAMENTO
A leitura da Bíblia nos permite inferir que as relações sexuais são parte essencial do casamento (Gênesis 1:28, Provérbios 5:18-19, 1 Coríntios 7:3-9, Hebreus 13:4 e o Cântico dos Cânticos de Salomão). No contexto do Novo Testamento era um dever cumprir o mandamento de crescer e multiplicar, especialmente para um casal aparentemente sem problemas de saúde e ambos religiosos devotos como pareciam ser José e Maria, que até mesmo recebiam mensagens enviadas por anjos (WITHERINGTON III & SHANKS, 2004). Se Maria foi agraciada por Deus, qual é o problema em ter sido agraciada também em termos de uma vida sexual saudável com seu marido e ter tido outros filhos? Nenhum, a não ser que se imagine Maria como uma deusa na qual José nem mesmo ousaria tocar. Isso não seria idolatria? Pense nisso.
Note inclusive que mesmo antes de o anjo aparecer à Maria e lhe revelar que conceberia um filho sem ter relações sexuais, ela já estava prometida em casamento a José. Isso seria muito estranho caso, como afirmam os romanistas, Maria tivesse desde muito cedo se consagrado a uma vida celibatária. Então a conclusão mais óbvia é que esse casamento seguiria seu curso normal, envolvendo relações sexuais e a geração de filhos, a não ser que se importe supostas revelações e outras crenças externas à Bíblia.
JESUS TINHA IRMÃOS?
O estudo da Bíblia nos permite afirmar que esse provavelmente é o caso:
  • Mateus 13:55-57 – 55 Não é este o filho do carpinteiro? O nome de sua mãe não é Maria, e não são seus irmãos Tiago, José, Simão e Judas? 56 Não estão conosco todas as suas irmãs? De onde, pois, ele obteve todas essas coisas?” 57 E ficavam escandalizados por causa dele. Mas Jesus lhes disse: “Só em sua própria terra e em sua própria casa é que um profeta não tem honra”.
  • Mateus 12:46-47 – 46 Falava ainda Jesus à multidão quando sua mãe e seus irmãos chegaram do lado de fora, querendo falar com ele. 47 Alguém lhe disse: “Tua mãe e teus irmãos estão lá fora e querem falar contigo”.
  • João 7:2-5 – 2 Mas, ao se aproximar a festa judaica dos tabernáculos, 3 os irmãos de Jesus lhe disseram: “Você deve sair daqui e ir para a Judéia, para que os seus discípulos possam ver as obras que você faz. 4 Ninguém que deseja ser reconhecido publicamente age em segredo. Visto que você está fazendo estas coisas, mostre-se ao mundo”. 5 Pois nem os seus irmãos criam nele.
  • 1 Coríntios 9:5 – Não temos nós o direito de levar conosco uma esposa crente como fazem os outros apóstolos, os irmãos do Senhor e Pedro?[iv]
  • Gálatas 1:19 – Não vi nenhum dos outros apóstolos, a não ser Tiago, irmão do Senhor.
A leitura mais natural do texto em Mateus 13:55-57 é a de um contexto familiar, visto que se menciona o “pai” (José, o carpinteiro), a mãe, os irmãos e as irmãs (GEISLER & MacKENZIE, 1995). Note inclusive que o próprio Jesus afirma que um profeta não tem honra em sua própria casa, ou seja, o contexto indica que se trata de uma família onde só se menciona parentes de 1º e 2º graus (pais e irmãos).
Apesar disso, os romanistas, baseados em Jerônimo, Cristão antigo, afirmam que esse não é o caso, pois em Hebraico e Aramaico, essa, a língua falada por Jesus, não havia um termo distinto para irmãos, primos e parentes próximos. Assim, afirmam que, apesar de ter-se utilizado a palavra irmão nesses casos, trata-se na verdade de primos ou outros tipos de parentes de Jesus. Uma pergunta pertinente seria: há nos textos acima referências sobre tios, primos, avós ou quaisquer outros parentes?
Ademais, o Novo Testamento não foi escrito em Hebraico ou Aramaico, mas sim em Grego, e ainda, sob a inspiração do Espírito Santo de Deus. Lemos irmãos em nossas Bíblias porque ao contrário do Aramaico, a língua Grega possui palavras bem definidas para se referir e diferenciar irmãos, primos e outros parentes próximos.
Assim, a palavra em grego utilizada para se referir aos irmãos de Jesus nos trechos Bíblicos citados acima é adelphos que normalmente quer dizer irmão mesmo (GEISLER & MacKENZIE, 1996). Caso os autores quisessem nos dizer que Jesus tinha primos, poderiam ter utilizado o termo anepsios (Colossenses 4:10). Se quisessem apenas se referir a eles como parentes próximos, poderiam ter utilizado o termo suggenes (Lucas 1:36). Aparentemente, adelphos não é utilizada no NT para se referir a primos ou parentes e os termos irmão e irmã aparecem várias vezes, sempre indicando irmãos e irmãs consangüíneos (Marcos 1:16, 1:19, 13:12, João 11:1-2, Atos 23:16 e Romanos 16:15) (GEISLER & MacKENZIE, 1996).
Ainda mais interessante é que Hegésipo, escritor Cristão do século II (cuja obra, foi, em parte, preservada por Eusébio, bispo de Cesaréia e historiador do século IV), distingue claramente os termos para se referir aos primos (anepsioi) de Jesus e seus irmãos, no caso, Tiago e Judas (WITHERINGTON III & SHANKS, 2004. De acordo com o autor: Hist.Eccl. 4.22.4, 2.23.4 e 3.20.1).
Pode-se ainda argumentar que o termo irmãos não necessariamente indica apenas os irmãos consangüíneos, mas também irmãos na fé ou compatriotas. Isso realmente é verdade, porém, não é problema, tendo em vista que o contexto nos permite diferenciar qual é o significado (Mateus 12:48-50). Um bom exemplo é o da relação entre Abraão e Ló, esse era sobrinho daquele (Gênesis 12:5), porém, também são chamados irmãos (Gênesis 13:8). Outra interpretação, preferida pelos ortodoxos e historiadores seculares é a de que José era um viúvo bem mais velho que Maria e os filhos mencionados seriam de seu primeiro casamento. Essa segunda visão, defendida por Epifânio, outro Cristão antigo, será discutida posteriormente.
De qualquer forma, os romanistas ainda alegam que esses casos citados seriam exceções, afirmam que um dos 12, Tiago “Menor”, filho de Alfeu, seria a mesma pessoa chamada de Tiago “Irmão do Senhor”, que a Maria esposa de Clopas, mãe de outros Tiago e José, mencionada em Mateus 27:56, Marcos 15:40 e João 19:25 é a Maria mãe dos irmãos/primos de Jesus em  Mateus 13:55, e, por último, que se Jesus tivesse irmãos, nunca teria entregado sua mãe aos cuidados de João (João 19:26-27), pois assim estaria desrespeitando a Lei de Moisés, que o obrigaria a deixá-la com seus irmãos.
Novamente, as explicações são simples e mostram que os argumentos romanistas são fabricações motivadas pela necessidade de se defender um dogma que não encontra base nas Escrituras.
Em primeiro lugar, nomes como José, Tiago, Maria e outros eram muito comuns naquele contexto e uma forma de se diferenciar as pessoas eram os qualitativos, por exemplo, fulano filho de A para diferenciar de fulano filho de B; apelidos, como o de Simão “Pedro”, Tiagos “Maior” e “Menor” e também indicativos do local de origem, tipo Jesus de Nazaré (WITHERINGTON III & SHANKS, 2004). Logo, podemos distinguir alguns Tiagos[v] e Marias no NT:

Casal
Filhos
Passagens
Marido
Esposa
1
José
Maria
Jesus
Tiago Irmão do Senhor
José
Simão
Judas
Mt 13:55-57
2
Zebedeu
Salomé
João
Tiago Maior



Mt 20:20; Mc 15:40; Mc 16:1;
3
Alfeu
Maria

Tiago Menor



Jo 19:25
4
Clopas*
Maria
José
Tiago
Simão**


Jo 19:26-27; Lc 24:18
*De acordo com Hegésipo, Clopas (ou Cléopas) era primo de José “pai” de Jesus.
**De acordo com Hegésipo, esse casal também tinha esse filho chamado Simão que foi o segundo bispo de Jerusalém. Nascido posteriormente? Ver também a tabela disponível em:

O Tiago irmão de Jesus não poderia ter sido Tiago Menor, filho de Alfeu e nem Tiago Maior, filho de Zebedeu, pois de acordo com a Bíblia:
  • João 7:2-5 – 2 Mas, ao se aproximar a festa judaica dos tabernáculos, 3 os irmãos de Jesus lhe disseram: “Você deve sair daqui e ir para a Judéia, para que os seus discípulos possam ver as obras que você faz. 4 Ninguém que deseja ser reconhecido publicamente age em segredo. Visto que você está fazendo estas coisas, mostre-se ao mundo”. 5 Pois nem os seus irmãos criam nele.
  • 1 Coríntios 15:5-8 – 5 e [Jesus] apareceu a Pedro e depois aos Doze. 6 Depois disso apareceu a mais de quinhentos irmãos de uma só vez, a maioria dos quais ainda vive, embora alguns já tenham adormecido. 7 Depois apareceu a Tiago e, então, a todos os apóstolos; 8 depois destes apareceu também a mim, como a um que nasceu fora de tempo.
Logo, de acordo com o trecho em João, como Tiago Menor e Tiago Maior poderiam fazer parte do grupo dos 12 discípulos mais próximos de Jesus, se não criam nele? Não há qualquer indicação na Bíblia de que eles fossem como Judas Iscariotes, então, nenhum desses dois Tiagos era o Irmão do Senhor. E de acordo com o trecho em 1 Coríntios, pra que Paulo mencionaria que Jesus apareceu aos 12, dos quais faziam parte os dois Tiagos apóstolos (v. 5), e depois, no v. 7, menciona um Tiago em destaque e depois os apóstolos restantes? Isso indica que possivelmente esse Tiago mencionado não era um apóstolo e ele nem mesmo é qualificado como Tiago Maior, Menor ou qualquer coisa. Inclusive, afirma-se que Tiago (irmão) pode ter se tornado um crente graças a essa aparição (BAUCKHAM, 2001).
Outro argumento seria o de que, até onde se sabe, Tiago Menor, filho de Alfeu não teve qualquer proeminência na Igreja primitiva, inclusive sem ter deixado nada escrito, ao contrário do Tiago Irmão de Jesus (MacARTHUR, 2004). Já Tiago Maior, filho de Zebedeu, morreu martirizado (Atos 12:1-3) antes do martírio de Tiago Irmão de Jesus (ca. 62 DC) (BAUCKHAM, 1999).
Falta descartar outro Tiago. Para isso é preciso demonstrar que a Maria mulher de Clopas e Maria mulher de Alfeu não eram a mesma pessoa. Ou em outras palavras, que Alfeu e Clopas não eram a mesma pessoa. Vários, se não a maioria dos argumentos romanistas em favor da virgindade perpétua de Maria assumem que Alfeu e Clopas eram um mesmo indivíduo. Porém, Lucas menciona tanto Clopas (Lucas 24:18) quanto Alfeu (Lucas 6:15 e Atos 1:13). Então qual seria a justificativa para um mesmo autor (inspirado pelo Espírito Santo de Deus!) usar dois nomes gregos distintos pra se referir à mesma pessoa (BAUCKHAM, 2004)?
A própria enciclopédia católica nos fornece informações para crermos que não são a mesma pessoa:
Entretanto, etimologicamente, a identificação dos dois nomes [Alfeu e Clopas] oferece sérias dificuldades: (1) Embora a letra Heth ocasionalmente seja usada em Grego como Kappa nos finais e meios das palavras, muito raramente é usada nos começos, onde a pronúncia aspirada da letra h é melhor protegida; porém, alguns exemplos disso são dados por Levy (Sem. Fremdwörter in Griech.); mas (2) mesmo se essa dificuldade fosse resolvida, Clopas pressupõe o aramaico Halophai, e não Halpai. (3) as versões Siríacas substituem o Grego Clopas com um Qoph e não com um Heth, como fariam naturalmente caso tivessem consciência da identidade de Clopas e Halpai; para Alfeu se utiliza Heth (e Aleph, ocasionalmente). [...] a questão da identidade de Alfeu e Clopas ainda está em aberto. (http://www.newadvent.org/cathen/04048b.htm – Acesso em 12 de Abril de 2011).
Mas há graves dificuldades em se identificar Alfeu e Cleopas dessa forma. Em primeiro lugar, São Lucas, que menciona Cleopas (24:18), também menciona Alfeu (6:15 e Atos 1:13). Podemos nos questionar se ele seria culpado de um uso tão confuso dos nomes, se eles se referissem à mesma pessoa. Novamente, enquanto Alphas é o equivalente do Aramaico, não é fácil ver como a forma Grega se tornou Cleopas, ou mais corretamente, Clopas. (http://www.newadvent.org/cathen/09748b.htm – Acesso em 12 de Abril de 2011).
Porém isso nos leva a pensar, caso analisemos os textos, que havia duas irmãs com o nome de Maria. Isso não seria impossível, mas, uma explicação melhor é a de que essas Marias não eram irmãs, mas sim cunhadas (em inglês é mais fácil entender o sentido: sisters-in-law), sendo que os irmãos na verdade seriam José “pai” de Jesus e Clopas (BAUCKHAM, 2004; WITHERINGTON III & SHANKS, 2004).
Por último, sobre Jesus ter errado ao deixar Maria aos cuidados de João e não de outro irmão, como alegam os romanistas, é só ler o que Jesus diz em Mateus 12:49-50, sobre quem são seus irmãos e afins: “Aqui estão minha mãe e meus irmãos! Pois quem faz a vontade de meu Pai que está nos céus, este é meu irmão, minha irmã e minha mãe“. Levando em consideração o fato de que os irmãos de Jesus ainda não criam nele, Jesus não cometeu erro algum ao deixar Maria sob os cuidados de João. Pode-se ainda especular que talvez ele tenha feito isso com o objetivo de abençoar João, o “filho do trovão” (Boanerges). É possível que tomando conta de Maria ele viesse a se tornar menos filho do trovão e mais filho de Deus (veja porque, por exemplo, em Marcos 9:38 e Marcos 10:35-37).
Foram tratadas as principais alegações dos romanistas. Vejamos a seguir os argumentos dos ortodoxos:
JOSÉ, O CARPINTEIRO CASCA-GROSSA
Em resumo, a hipótese preferida pelos ortodoxos é a visão de Epifânio: José era um viúvo e todos os seus filhos (Tiago, José, Simão, Judas, Salomé e Maria) seriam de seu primeiro casamento. Acredita-se que teve seu primeiro filho aos 40 anos e já tinha pelo menos 80 anos quando se casou com Maria (BAUCKHAM, 2004).
Um primeiro ponto que se deve destacar o seguinte: essa visão surgiu no século II, aparecendo não nos textos canônicos, mas sim nos apócrifos: no proto-evangelho de Tiago, no evangelho de Pedro (em uma parte perdida) e no evangelho de Tomé (BAUCKHAM, 2004; WITHERINGTON III & SHANKS, 2004). Ademais, essas obras parecem ter origem Síria, onde se enfatizavam práticas ascéticas que divergiam daquelas das visões dos Judeus e Cristãos da Jerusalém do século I (WITHERINGTON III & SHANKS, 2004). Também se afirma que o proto-evangelho de Tiago tem um interesse claro em glorificar Maria como uma virgem consagrada (BAUCKHAM, 2004). Mas como já vimos, uma virgem consagrada não poderia ter sido prometida em casamento a José.
Outro ponto interessante é o de que, aparentemente, essa é a visão preferida para alguns estudiosos que parecem botar os textos apócrifos em pé de igualdade com os canônicos, porém, mesmo assim, esses especialistas afirmam que Simão e Judas eram filhos de Maria e José[vi]. Logo, nem assim Maria poderia ter permanecido virgem para sempre.
De qualquer forma, analisando os textos canônicos, supor que José fez nada mais que assumir o papel de protetor de Maria não faz muito sentido. Primeiro porque esses supostos filhos e filhas de José, mais velhos que Jesus, não são mencionados em nenhum momento nas porções iniciais dos Evangelhos, referentes ao nascimento e infância de Jesus. Especialmente no caso da ida à Jerusalém (Lucas 2:41-52), como eram todos mais velhos que Jesus e faziam parte de uma família devota, definitivamente teriam ido para participar do festival (WITHERINGTON III & SHANKS, 2004). Em segundo, José teria de estar trabalhando como carpinteiro na velhice, para ensinar Jesus e ainda sustentar a família, assim, com mais de 80 anos de idade, naquele contexto, você consegue imaginar um senhor de idade serrando madeira ou conduzindo uma mulher grávida para o Egito?
Se essa visão estiver certa, somos obrigados a crer que, além de José, Tiago (irmão) também seria um velhinho casca-grossa. Se ele nasceu quando José tinha 40 anos, quando Jesus Nasceu ele teria por volta de 60, e, quando foi martirizado em 62 DC, já teria passado dos 100 (WITHERINGTON III & SHANKS, 2004).
Talvez em parte a aceitação dessa visão se deva ao fato de que José não aparece nos relatos em que Jesus havia iniciado seu ministério e também porque Maria foi deixada aos cuidados de João. Realmente, é mesmo muito provável que no tempo em que Jesus tivesse iniciado seu ministério José estivesse morto, porém, nada impede que ele tenha casado com Maria na idade normal de aproximadamente 16 anos (WITHERINGTON III & SHANKS, 2004) e morrido de outras causas. Afirmar que ele era velho é um argumento a partir do silêncio, motivado pelo anseio em justificar o dogma.
Tendo visto essas três posições, podemos afirmar que tanto as visões de Jerônimo quanto as de Epifânio são problemáticas e a melhor explicação para o parentesco entre Jesus e seus irmãos é o que a leitura mais natural indica: que José e Maria tiveram outros filhos, logo, ela não permaneceu virgem para sempre.
Infelizmente, a ICAR anatematiza quem discorda. Mas se esse é o seu caso, não seria melhor adotar o Cristianismo Bíblico?
REFERÊNCIAS
BAUCKHAM, R. The Relatives of Jesus. Themelios. V.21(2). January 1996. pp:18-21. Disponível em: http://www.biblicalstudies.org.uk/article_relatives_bauckham.html (acesso: 28/09/2010).
BAUCKHAM, R. James. Routledge. 1999.
BAUCKHAM, R. Em: CHILTON, B. & NEUSNER, J. The Brother of Jesus – James the Just and his Mission. Westminster John Knox Press. 2001.
BAUCKHAM, R. Jude and the Relatives of Jesus in the Early Church. T & T Clark International. 2004.
GEISLER, NL. & MaCKENZIE, R. Roman Catholics and Evangelicals – Agreements and Differences. Baker Books. 1995.
MacARTHUR, J. Doze Homens Comuns. Editora Cultura Cristã. 2004.
WITHERINGTON III, B. & SHANKS, H. The Brother of Jesus – The Dramatic Story & Meaning of the First Archaeological Link to Jesus & His Family. HarperCollins. 2004.

[i] http://beggarsallreformation.blogspot.com/2010/07/luther-was-wrong-roman-catholic-saint.html
[ii] http://www.ecclesia.com.br/biblioteca/documentos_da_igreja/os_canones_do_segundo_concilio_de_constantinopla.html.
[iii] http://history.hanover.edu/texts/trent/ct24.html
[iv] Inclusive, esse trecho parece indicar que os irmãos de Jesus eram missionários viajantes (BAUCKHAM 1996).
[v] É interessante notar que, de acordo com WITHERINGTON III & SHANKS, 2004, todas as pessoas que aparecem chamadas de Tiago (ou James em língua inglesa), na verdade se chamavam Ya’akov, Jacó.
[vi] Essa sugestão pode ser vista, por exemplo, no documentário The Real Family of Jesus. Disponível em várias partes no Youtube.

quinta-feira, 3 de novembro de 2011

O glorioso plano de Deus para sua vida

Referência: Romanos 8.29-30
INTRODUÇÃO
A Carta de Paulo aos Romanos é considerada a cordilheira do Himalaia de todos os escritos de Paulo. Mas, Romanos capítulo 8 é considerado o pico Everest, o ponto culminante.
Vamos considerar aqui algumas verdades preciosas sobre o glorioso plano de Deus para sua vida.
1. Deus tem um plano eterno, perfeito e vitorioso
O universo não é dirigido pelo acaso nem pelo determinismo. A história não é cíclica nem caminha para o ocaso. Deus tem um plano perfeito e nenhuma folha cai de uma árvore sem que ele permita. Você está incluído nesse plano eterno de Deus. Ele criou você, formou você de forma assombrosamente maravilhosa e traçou um plano na sua vida. Todos os seus dias foram escritos e determinados quando nenhum deles havia ainda.
Nenhum poder neste mundo ou no vindouro pode mudar desfazer esse glorioso propósito de Deus em sua vida.
2. Deus já determinou o fim desde o começo
Paulo diz que os predestinados, que são chamados e justificados, já estão glorificados. Embora a glorificação seja um fato futuro, na mente e nos decretos de Deus você já está no céu. Não importa quão estreito seja o caminho. Não importa com ferozes sejam os inimigos. Não importa quão dura seja a oposição do inferno. Você é mais do que vencedor. Você não tem apenas expectativa de vitória. Você é vencedor! Você não vai ficar no meio do caminho. Deus já decidiu e determinou levar você para a glória.
3. Os elos dourados do plano gracioso de Deus na sua vida
Paulo nestes dois versos nos mostra os elos dessa corrente dourada da graça. Esse plano vai de eternidade a eternidade. Ele começa antes do tempo e avança rumo a eternidade.
Vejamos como se desenrola esse plano perfeito, eterno, e vitorioso:
I. DEUS CONHECEU VOCÊ DE ANTEMÃO (Rm 8.29)
1. Na eternidade, antes que houvesse mundo, você já estava no coração de Deus
Deus conheceu você antes de lançar os fundamentos da terra. Você já estava no coração de Deus antes de Deus criar o universo. O verbo “conhecer” significa amar. É o mesmo verbo yadá em Gênesis 4.1, quando diz que Adão conheceu a Eva e ela concebeu. Deus conheceu você intimamente quando você ainda não existia. Você foi concebido na mente de Deus antes de ser concebido no ventre da sua mãe. Há filhos que podem não ser programado pelos seus pais, mas você foi programado na mente de Deus antes dos tempos eternos.
2. No tempo foi Deus que tomou a iniciativa de relacionar-se com você
Não foi você quem amou a Deus primeiro, foi Deus quem o amou primeiro e o atraiu com cordas de amor.
Não foi você quem descobriu a Deus, foi Deus quem o encontrou e restaurou a sua sorte.
Não foi você quem escolheu a Deus, foi ele quem escolheu você. Jesus disse: “Não fostes vós que me escolhestes a mim, pelo contrário, eu vos escolhi”.
Tudo provém de Deus. Foi ele mesmo quem nos buscou, quem nos encontrou, quem nos reconciliou consigo mesmo.
II. DEUS PREDESTINOU VOCÊ PARA A SALVAÇÃO (Rm 8.30)
1. A eleição de Deus foi eterna
A escolha de Deus não foi um plano “B” porque o plano “A” fracassou. Não foi uma decisão de emergência para reparar um plano frustrado. Não, Deus escolheu você antes dos tempos eternos (2Tm 1.9).
A Bíblia diz que Deus escolheu você antes da fundação do mundo (Ef 1.4).
A Bíblia diz que Deus escolheu você desde o princípio (2Ts 2.13).
A Bíblia diz que Deus conheceu você de antemão e predestinou você para ser semelhante a Jesus.
Antes de Deus determinar criar os céus e a terra, ele já havia determinado amar você, escolher você e levar você para o céu.
2. A eleição de Deus foi incondicional
a) Deus não escolheu você porque ele previu que você poderia crer nele – Não! Pois se assim fosse, a causa da sua salvação estaria na sua fé. A fé não é a causa da eleição, mas o resultado dela. A Bíblia diz: “Todos quantos haviam sido destinados para a vida eterna creram” (At 13.48). Não diz o texto que todos os creram foram destinados para a vida eterna, mas que todos os que foram destinados para a vida eterna creram. Assim, a fé não é a causa da eleição, mas sua conseqüência. Como diz João Calvino, a eleição é a mãe da fé.
b) Deus não escolheu você por causa das suas boas obras – Ao contrário, Deus escolheu você para as boas obras. A Bíblia diz que “Somos feitura de Deus, criados em Cristo Jesus para as boas obras” (Ef 2.10). Deus não nos escolheu porque fazíamos o bem, mas para fazermos o bem. Ele não escolheu por qualquer mérito nosso, mas a despeito do nosso demérito.
c) Deus não escolheu você por causa da sua santidade – Ao contrário, Deus escolheu você para você ser santo e irrepreensível (Ef 1.4). A santidade não é a causa da eleição, mas sua conseqüência.
d) Deus não escolheu você por causa da sua obediência – Ao contrário, Deus escolheu você para a obediência (1Pe 1.2). Deus escolheu Jacó no ventre da sua mãe, antes que ele praticasse o bem ou o mal. Deus escolheu você independentemente de seus méritos ou deméritos. A causa da sua eleição está no amor de Deus e não nos seus merecimentos.
3. A eleição de Deus foi proposital
Àqueles que se opõem à bendita doutrina da eleição divina dizendo que ela é um estímulo a uma vida relaxada, a Bíblia responde: “Deus nos conheceu de antemão e nos predestinou para sermos conformes à imagem de Cristo” (Rm 8.29). O grande projeto da eleição divina é nos tornar parecidos com Jesus. Não é apenas de nos levar para a glória, mas de nos tornar semelhantes ao rei da glória.
Deus nos predestinou para atingirmos a estatura do Varão Perfeito e não para vivermos dissolutamente. Quem vive no pecado nunca viu a Deus. A eleição não produz soberba, mas humildade. Não induz ao pecado, mas nos estimula à santidade.
Àqueles que dizem que a doutrina da eleição acaba induzindo as pessoas a uma vida de pecado, a Bíblia responde que Deus nos escolheu para sermos santos e irrepreensíveis (Ef 1.4). Portanto, devemos provar a nossa eleição por meio de uma vida de santidade. A única garantia que somos um povo eleito é se somos um povo santo.
III. DEUS CHAMOU VOCÊ PARA A SALVAÇÃO (Rm 8.30)
Há dois chamados: um externo e outro interno; um geral e outro específico; um dirigido aos ouvidos e outro ao coração.
A Bíblia diz que “muitos são chamados, mas poucos os escolhidos”.
Jesus disse: “As minhas ovelhas ouvem a minha voz e me seguem”.
Jesus disse: “Quem é de Deus ouve a Palavra de Deus”.
1. O chamado de Deus é irresistível
Você ouve uma mensagem, escuta um hino, lê um folheto, um livro evangélico e de repente seu coração é tocado e aberto. De repente as escamas caem dos seus olhos e aquilo que você não compreendia passa a compreender. Aquilo que você não amava passa a amar.
Essa entrega não é algo forçado. Você não é agredido, violentado. Ao contrário, o Espírito Santo muda as disposições íntimas da sua alma. Você é gerado da semente incorruptível, você nasce de novo, nasce de cima, do Espírito. Gostosamente você se rende a Jesus. Mas, no mesmo ato da sua entrega você descobre que foi Deus quem lhe abriu o coração. Foi Deus quem lhe deu o arrependimento para a vida. Foi Deus quem lhe deu a fé salvadora. Foi Deus quem lhe deu um coração de carne. Foi Deus quem lhe reconciliou consigo mesmo. Foi Deus quem lhe justificou. Tudo provém de Deus e é ele mesmo quem opera em você tanto o querer como o realizar.
Você pode até resistir a esse chamado de Deus por algum tempo como Jacó. Mas se preciso for ele tocará em seu corpo e lhe deixará manco.
Você pode até resistir como Nabucodonosor. Mas se preciso for ele lhe despojará de todo orgulho, vaidade e soberba e jogará você ao chão.
Você pode até resistir por algum tempo como fez com Manassés, mas se preciso for, ele jogará você numa cova profunda até você reconhecer que ele ama você!
2. O chamado de Deus é eficaz
Jesus disse: “Todo aquele que meu Pai me dá, esse vem a mim e o que vem a mim, de modo algum eu o lançarei fora”.
Jesus disse: “Tenho ainda outras ovelhas. Elas ouvirão a minha voz e me seguirão”.
Se Deus não nos chamasse, jamais o buscaríamos. A inclinação da nossa carne é inimizade contra Deus. Se Deus não nos despertasse, jamais iríamos a ele, pois estamos mortos nos nossos delitos e pecados.
ÓH! Como é bendito o amor de Deus que nos escolhe e nos chama da morte para a vida, das trevas para a luz, da potestade de Satanás para o reino do seu amor.
IV. DEUS JUSTIFICOU VOCÊ DE TODOS OS SEUS PECADOS (Rm 8.30)
1. A justificação é um ato legal
A justificação é o coração da Bíblia. A justificação não é um processo, é um ato; ela não acontece dentro de nós, mas fora de nós; ela não é algo que Deus faz em nós, mas por nós. O homem mais santo e o crente mais fraco estão justificados do mesmo jeito, na mesma proporção.
2. A justificação nos livra da condenação dos nossos pecados
A Bíblia diz que todos somos pecadores e que não há justo nem um sequer.
A Bíblia diz que todos são culpados diante de Deus e que ele não inocentará o culpado, pois a alma que pecar essa morrerá e que o salário do pecado é a morte.
A Bíblia diz que todos nós vamos comparecer perante o justo tribunal de Cristo e todos vamos ter que prestar contas da nossa vida.
A Bíblia diz que os livros serão abertos e nós seremos julgados segundo o que estiver escrito nos livros.
a) Seremos julgados pelas nossas palavras
A Bíblia diz que vamos dar conta no dia do juízo por todas as palavras frívolas que proferimos.
Muitas coisas nós falamos que temos vergonha de referir. Foram palavras ásperas, palavras impensadas, palavras torpes, palavras ferinas, cheias de veneno. Não nos lembramos mais, mas essas palavras estão escritas nos livros de Deus e no dia do juízo elas serão cobradas de nós.
b) Seremos julgados pelas nossas obras
A Bíblia diz que pelas obras ninguém pode salvar-se, pois nossas obras estão contaminadas. Quanta coisa você fez que seu marido, sua esposa, seus pais, seus filhos, seus irmãos não souberam e não sabem, mas Deus sabe. Nada escapa ao seu conhecimento. Para ele luz e trevas são a mesma cousa.
Quantas coisas você fez e o braço da lei não conseguiu pegar você, mas no dia do juízo aquilo que você fez escondido será proclamado dos eirados.
c) Seremos julgados pela omissão
Quando Jesus vier na sua glória e assentar-se no seu trono, ele vai julgar as nações. Ele vai dizer aos que estiverem à sua esquerda: “Apartai-vos de mim malditos, para o fogo eterno, preparado para o diabo e seus anjos”. Você pode perguntar: “O que essas pessoas fizeram de tão horrendo para irem para o lago do fogo?”
Sabe o que elas fizeram? Nada! Jesus lhes disse que estivera com fome, com sede, nu, doente, enfermo e forasteiro e não fora assistido. Por deixarem de fazer essas coisas aos pequeninos, deixaram de fazer a Jesus.
De tal maneira que você pode estar em sua casa, não fazendo mal para ninguém, não falando mal de ninguém e ainda cometendo um terrível pecado de omissão.
d) Seremos julgados pelos pensamentos e desejos
Paulo diz que Deus vai julgar o segredo do coração dos homens. Ninguém poderá escapar. Nenhum tribunal da terra tem competência para julgar foro íntimo. Paulo ao ler os dez mandamentos ficou alarmado com o décimo. Ele descobriu quão maligno é o pecado. Percebeu que o décimo mandamento fala de algo subjetivo. Então, ele se desesperou!
Você na verdade é mais pecador que pensa que é.
Ilustração: Os dez pensamentos por dia.
Ilustração: O omelete.
Deus exige perfeição para entrar no céu. Você não é perfeito. Para entrar no céu, você não pode ter nenhum pecado.
A Bíblia diz que se você guardar toda a lei e tropeçar num único mandamento, você é culpado da lei inteira, pois maldito é aquele que não perseverar em toda a obra da lei para a cumprir.
Você então pode dizer: “então estou perdido!”. É isso mesmo! Não há nenhuma chance de você ser salvo, pelos seus esforços e méritos.
3. O que Deus fez por você em Cristo
O que você não podia fazer, Deus fez por você. Ele enviou o seu Filho ao mundo como seu representante e fiador. Ele veio como seu substituto. Ele foi à cruz em seu lugar.
Quando ele estava na cruz. Deus lançou sobre ele o pecado de todos nós. Ele foi moído e traspassado pelos seus pecados. Naquele momento ele foi feito pecado por nós. Naquele momento ele foi feito maldição por nós. Naquele momento não havia beleza nele. O sol escondeu o rosto e Deus lhe desamparou. Naquele momento ele desceu ao inferno.
Então, no topo do Calvário, sofrendo a penalidade do nosso pecado, ele deu um grande brado: “TETÉLESTAI” – “Está consumado!”. Naquela hora, ele pegou o escrito de dívida que era contra nós, rasgou-o, e o encravou na cruz, triunfando sobre o diabo e suas hostes. Naquele momento ele pagou sua dívida, ele justificou você e agora nenhuma condenação há mais para aqueles que estão em Cristo Jesus.
4. A justificação é mais do que perdão
A justificação é mais do quer perdão. Imagine que eu devesse um milhão de reis. Eu não tenho um milhão de reais. Imagine que estivesse falido. Então, alguém bondosamente vai ao banco e deposita em minha conta um milhão de reais e eu fico livre da dívida. Isso é perdão.
Mas Cristo não apenas pagou minha dívida impagável, mas foi lá na minha conta e fez um depósito infinito. Ele depositou em minha conta a sua infinita justiça. “Àquele que não conheceu pecado, Deus o fez pecado por nós para que nós fôssemos feitos justiça de Deus”.
Aleluia! Isso é justificação.
V. DEUS GLORIFICOU VOCÊ E JÁ DETERMINOU LEVAR VOCÊ PARA A GLÓRIA (Rm 8.30).
Depois de tudo o que Deus fez por você, Paulo não poderia terminar esse texto de outra forma. Ele coloca a glorificação no passado, como um fato consumado. Isso, porque, na mente e nos decretos de Deus você já está no céu!
1. Você terá um corpo de glória, semelhante ao corpo do Senhor Jesus
Seu corpo será imortal, incorruptível, glorioso, poderoso, espiritual, e celestial. Seu corpo vai brilhar como as estrelas e como o sol no seu fulgor. Não haverá mais cansaço nem fadiga. Não haverá mais envelhecimento nem rugas. Não haverá mais dor nem doença. Não haverá mais lágrima nem luto. Não haverá mais pobreza nem miséria, pois habitaremos com ele na cidade santa, em mansões feitas não por mãos humanas, mas eternas no céu.
2. Você terá um novo lar
Você vai, então, para a Pátria celeste, para a Casa do Pai, para o Seio de Abraão, para a Jerusalém Celeste, para o Paraíso. Aquilo que nenhum ouvido ouviu nem jamais olho viu, você vai experimentar por toda a eternidade.
3. Você terá uma gloriosa herança
Aqui temos fadiga, cansaço, dor, tristeza, frustrações, injustiças. Mas, então, Deus lhe dará uma herança imarcescível, uma herança bendita. Você receberá a coroa da vida, a coroa da justiça, a coroa da glória.
Você ouvirá do Senhor: “Vinde bendito de meu Pai, entre na posse do Reino que está preparado para você desde a fundação do mundo”.
Você vai para a glória e para o trono, pois você reinará com ele para sempre.
CONCLUSÃO
Paulo termina esse majestoso assunto, onde ele alcançou os picos culminantes da revelação divina, fazendo cinco perguntas retóricas:
1) Se Deus é por nós, quem será contra nós?
2) Aquele que não poupou o seu próprio Filho, porventura não nos dará graciosamente com ele todas as coisas?
3) Quem intentará acusação contra os eleitos de Deus?
4) Quem os condenará?
5) Quem nos separará do amor de Deus que está em Cristo?

Rev. Hernandes Dias Lopes (1ª IP Vitória-ES)

Pastoral Reformada


A glória de Deus, fim último de todas as coisas
Deus e não o homem é o centro do universo. O homem é um ser criado e dependente enquanto Deus é o criador e auto-existente. Deus é completo e perfeito em si mesmo. Ele não depende da criação para ser Deus nem deriva glória dela para ser pleno. Muito embora Deus seja uno também é trino. É um só Deus em três pessoas distintas, de tal forma que o Pai não é o Filho nem o Filho o Pai. O Filho não é o Espírito Santo nem o Espírito Santo é o Pai. Essas três Pessoas divinas e distintas, desde toda a eternidade, resolveram criar todas as coisas para o louvor da sua glória e formar o homem à sua imagem e semelhança, a fim de que este o conhecesse e o glorificasse, pela riqueza de sua graça.

A despeito da raça humana ter caído em desventura e pecado, Deus não desistiu de nós, antes enviou-nos seu bendito Filho, para ser nosso redentor. Tanto o amor de Deus por nós é eterno como também é eterna sua provisão para nosso pecado, uma vez que, nos decretos de Deus, o Cordeiro de Deus foi morto desde a fundação do mundo (Ap 13.8). Deus jamais desistiu de nos amar e nos atrair para si com cordas de amor. Seu amor é eterno, incondicional, perseverante e sacrificial. Deus nos amou quando nós éramos fracos, ímpios, pecadores e inimigos. Estando nós perdidos, Deus nos encontrou. Estando nós cegos, Deus iluminou os olhos da nossa alma. Estando nós mortos em delitos e pecados, Deus nos deu vida juntamente com Cristo. E por que Deus fez tudo isso? Para o louvor da sua glória!


A glória de Deus é o fim último de todas as coisas. Todas as coisas foram criadas e existem para que Deus seja glorificado. O apóstolo Paulo, escrevendo aos Romanos, sintetiza essa magna verdade, nos seguintes termos: “Porque dele, por meio dele, e para ele são todas as coisas” (Rm 11.36). Chamamos a atenção, portanto, para três verdades aqui:


1. Deus é a origem e o dono de todas as coisas.
O universo não veio à existência por geração espontânea nem surgiu de uma explosão cósmica. Em vez de ser o resultado de uma evolução de milhões e milhões de anos, foi criado por Deus para a sua própria glória. Deus é a fonte e Deus é dono do universo. Não há um centímetro sequer do vasto cosmos onde Deus não possa dizer: “Isto foi criado por mim. Isto é meu. Isto existe para a minha glória”.

2. Deus é o sustentador de todas as coisas.
Não apenas todas as coisas são de Deus, mas também, todas as coisas são por meio dele. Deus não é apenas o criador do universo e tudo o que nele há, é também seu sustentador. Deus não é apenas transcendente, é também imanente. Não apenas está fora da criação, é maior do que ela e independente dela, mas interfere na criação e dela cuida. Em Deus nós vivemos, nos movemos e existimos. É Deus quem nos dá respiração e tudo o mais. Ele é o nosso criador e provedor. Ele é o Deus da criação e também o Deus da providência. Ele é o Deus que perdoa as nossas iniquidades e nos coroa de graça e misericórdia.

3. Deus é a razão máxima para a qual todas as coisas existem.
Paulo conclui dizendo que todas as coisas são para ele. Fomos criados por Deus e nossa existência não encontra seu pleno significado enquanto não nos voltamos para Deus. Não vivemos para nós mesmos. Não somos o fim último de nossa própria existência. Não viemos a este mundo para construirmos monumentos a nós mesmos. Fomos criados e salvos para o louvor da sua glória. O universo deve ser o palco iluminado onde resplandece a glória de Deus. Nossa vida deve ser a plataforma onde se desenrola o eterno, perfeito e vitorioso projeto divino, cujo fim último é a manifestação da glória de Deus. É quando vivemos nessa dimensão que encontramos deleite e prazer na vida. É quando focamos nossa vida em Deus que encontramos a nós mesmos. É quando vivemos para Deus, que ele é glorificado em nós e nós sentimos mais prazer nele!

Rev. Hernandes Dias Lopes

segunda-feira, 31 de outubro de 2011

Educação dos Filhos da Aliança – Entendendo a Responsabilidade

 (Artigo do Rev. Elianai Batista, antes Arminiano e credobatista, hoje reformado e pedobatista)
Sou pastor de uma igreja que, pela graça de Deus, passou por um processo de reforma, um processo de retorno às Escrituras no que diz respeito à doutrina, ao culto e à prática. Neste processo, uma das doutrinas que nos trouxe um grande impacto foi a doutrina da aliança. Nós a estudamos por cerca de dois anos, até que nossos filhos vieram a receber o selo da aliança, o santo batismo. Com o aprendizado da doutrina da aliança, logo percebemos que não estávamos educando nossos filhos a partir do pressuposto de que eles pertencem a Deus. Isso nos levou a nos preocuparmos cada vez mais com a educação dos nossos filhos e, por isso, começamos a estudar sobre a educação cristã.Como pastor e pai, sei que há o grande perigo de abraçarmos a doutrina bíblica da aliança sem, contudo, vermos as implicações da aliança no que concerne à educação de nossos filhos. Creio que a compreensão da doutrina da aliança deve nos levar a uma reforma na educação dos nossos filhos. Por isso, escrevo esta série de artigos na esperança de que o Senhor promova tal reforma, principalmente entre aqueles que confessam a doutrina da aliança. Neste primeiro artigo procuraremos entender nossa responsabilidade como pais e, nos próximos, veremos não só o perigo que nossos filhos estão correndo sendo submetidos a uma educação humanista como também aquilo que podemos fazer a esse respeito.
Neste primeiro artigo, precisamos atentar para algo muito importante, precisamos de uma resposta para a seguinte pergunta: de quem é a responsabilidade pela educação dos filhos da aliança? A resposta parece óbvia. E é mesmo. Creio que todos concordarão que os responsáveis são os pais. Mas, mesmo concordando com isso, na prática, muitos pais correm o risco de dividir a educação de seus filhos em duas ou três partes, responsabilizando-se apenas parcialmente.
Quando isso ocorre, os pais tendem a dizer: “Nós não estamos habilitados para ensinar, por exemplo, ciências a nossos filhos, portanto, essa é uma responsabilidade do professor. Nossa responsabilidade é de educar em relação a outros assuntos”. Assim, se pode chegar à seguinte divisão na educação dos filhos e, consequentemente, da vida:
  1. Educação moral. Os pais dizem: “É nossa responsabilidade”. Ainda que, já aqui, haja muita intromissão da escola — intromissão que, por vezes, é tolerada.
  2. Educação intelectual. Os pais dizem: “É responsabilidade da escola”. Neste caso, os pais se limitam a cobrar dos filhos boas notas e algum compromisso com os estudos.
  3. Educação religiosa (bíblica). Os pais dizem: “É responsabilidade da igreja”. Aqui muitos pais se omitem de ensinar a Palavra de Deus a seus filhos de uma maneira consistente, transferindo a responsabilidade para os oficiais da igreja e para as professoras de Escola Dominical.
Tal concepção educacional tem como origem e consequência uma divisão da vida em vários compartimentos. É como se não houvesse unidade entre essas áreas e como se houvesse uma separação entre espiritual e material (gnosticismo). Tal visão não está de acordo com a Palavra de Deus, que nos ensina que tudo pertence ao Senhor (Sl 24) e que até as mínimas coisas devem ser feitas para a glória de Deus (1 Co 10.31).
Essa tricotomia educacional (separação entre campos moral, intelectual e espiritual), pode fazer com que os pais entreguem seus filhos à escola, entendendo que é responsabilidade dela educar seus filhos intelectualmente. Se a escola é pública, o Estado é visto como o responsável pela educação dos filhos. E em nosso país, onde o Estado costuma ganhar um status de deus que deve nos dar tudo e em quem devemos confiar e esperar, tudo isso se agrava. Então se o Estado ocupa nossos filhos tirando-os de casa, se ele provê material escolar, merenda, roupas e, em alguns casos, até dá um dinheiro por filhos matriculados, muitos pais se darão por satisfeitos (q.v. Sl 146). Por outro lado, se é particular, a escola também é vista como responsável pela educação dos filhos. Neste caso, os pais podem dizer: “Nós estamos pagando, então a responsabilidade é da escola”. Com isso, os pais podem imaginar que estão cumprindo com sua obrigação, oferecendo a seus filhos uma “educação de qualidade”. Em ambos os casos, o grande perigo é diminuir a responsabilidade dos pais quanto à educação dos filhos e transferi-la a terceiros. Porque é mais fácil colocar a culpa em terceiros se algo der errado.
Mas o que cada pai cristão precisa lembrar, e especialmente nós que professamos a fé denominada de reformada, e que cremos que Deus estabeleceu uma aliança com seu povo, aliança da qual nossos filhos também participam, é que a responsabilidade de educar nossos filhos é nossa. Cada pai é responsável por educar seus filhos em todos os sentidos, seja no âmbito moral, espiritual ou intelectual.
Portanto, os pais não devem ver a educação de seus filhos partimentada, mas, como um todo pelo qual são responsáveis. É verdade que eles podem pedir ajuda, mas a responsabilidade, perante Deus, continua sendo dos pais. Em Efésios 6.4, lemos sobre esta responsabilidade. A primeira coisa que podemos notar é que o apóstolo Paulo utiliza uma palavra que geralmente é usada para referir-se a “pais” no sentido masculino, o que faz recair um peso maior de responsabilidade sobre o cabeça da família, no que concerne à educação dos filhos. No entanto, precisamos notar que a responsabilidade dos pais (masculino), não exclui a responsabilidade das mães, que devem ser auxiliadoras também nisso. É, portanto, responsabilidade dos pais (pai e mãe) criarem seus filhos. O verbo “criar” tem o significado de “nutrir”, “cuidar”, e a idéia é de ajudar a florescer, ou seja, de ajudar os filhos a alcançarem maturidade em todas as áreas da vida. Podemos pensar nos filhos como pequenas plantas, as quais regamos, aplicamos nutrientes, protegemos, limpamos, em suma, cultivamos com todo cuidado esperando que um dia possam dar frutos. Isso mostra que a participação dos pais na educação de seus filhos é ativa. Se desejam que seus filhos produzam frutos para a glória de Deus, eles devem nitri-los para esse fim.
O texto também nos mostra como devemos fazer isso. Primeiro somos instruídos sobre o que não fazer, isto é, os pais não devem provocar seus filhos à ira. A razão disso nos é fornecida no texto paralelo em Cl 3.21: “… para que não fiquem desanimados”. Portanto, ao criarem seus filhos, os pais devem ter todo cuidado para não encher os corações deles de amargura e desânimo, fazendo com que obedeçam apenas por medo. Pelo contrário, devem dirigir o coração de seus filhos à obediência exigida (Ef 6.1-3), utilizando a “disciplina e admoestação do Senhor”. A palavra “disciplina” (paideia), que também pode ser traduzida por “treinamento”, “instrução”, se refere a tudo aquilo que concorre para o desenvolvimento mental, moral e espiritual da criança, é a educação por meio de regras e normas e que pode envolver recompensas ou castigos. A “disciplina” tem como alvo a vontade da criança. Já a palavra “admoestação” (nouthesia), pode ser traduzida por “advertência”, “instrução”. É a educação por meio de instrução verbal visando a correção do pensamento, da mente. A “admoestação” tem como alvo o intelecto da criança.
Por fim, o texto nos ensina que essa “disciplina e admoestação” devem ser “no Senhor”, isto é, a educação deve se desenvolver sob a autoridade que o Senhor dá e de acordo com a Sua Palavra. Isso nos chama a atenção para o fato de que o Senhorio de Cristo deve ser reconhecido também na educação dos filhos, mesmo aí, não podemos nos submeter a outro senhor.
Portanto, à luz de Efésios 6.4, devemos reconhecer que os pais são responsáveis por “nutrir” seus filhos, para um desenvolvimento pleno, como o próprio Senhor Jesus se desenvolveu como homem (Lc 2.52). Os pais são responsáveis por educar seus filhos e não devem se desfazer desta responsabilidade.
E talvez você pergunte: Se a responsabilidade da educação em todos os âmbitos é dos pais, então qual o papel da escola? A escola e seus professores são meios que os pais podem utilizar para cumprir sua responsabilidade de educar seus filhos. Neste caso, o professor tem autoridade delegada pelos pais para ensinar seus filhos, e ainda que o professor seja também responsável, a responsabilidade final recai sobre os pais. Então se um professor está ensinando a seus filhos que não há nenhum problema em uma união homossexual, que a questão de sexo masculino ou feminino é uma questão de opção, que Deus não existe, que o mundo veio de uma grande explosão, que não existe verdade absoluta, que o aborto deveria ser legalizado, que não existe pecado ou que o homem é inerentemente bom, você, pai, é responsável por isso diante de Deus.
Então, como vocês podem perceber, este é um assunto muito sério. Os pais devem sentir o peso de sua responsabilidade na educação de seus filhos. E já que a responsabilidade é dos pais, então a educação dos filhos é algo para o qual os pais devem dar muita atenção. Eles não podem simplesmente entregar seus filhos à escola, seja cristã ou não, como se não fosse sua responsabilidade a educação como um todo.
Isso nos leva a outro ponto, isto é, à questão do tipo de educação que os filhos da aliança devem receber. Quanto a isso, em resumo, podemos dizer: os filhos da aliança devem receber uma educação conforme a Escritura e para a glória de Deus.
É isso que nos ensinam as Escrituras, por exemplo, no Salmo 78. Este Salmo é uma meditação histórica cujo objetivo por um lado é exaltar a graça e a misericórdia do SENHOR no estabelecimento e manutenção da Sua aliança e por outro demonstrar a ingratidão, rebeldia e infidelidade do povo da aliança. À luz disso, o salmista se dirige ao povo da aliança na qualidade de mestre e o encoraja a instruir as futuras gerações a fim de que não sejam como seus pais, “geração obstinada e rebelde, geração de coração inconstante, e cujo espírito não foi fiel a Deus” (v.8). Podemos notar alguns princípios no início do Salmo:
  1. A educação dos filhos da aliança é responsabilidade dos pais (vv.3-5). Notem os verbos: ouvir, aprender, não encobrir, contar, transmitir. É o Deus da aliança que confere essa responsabilidade aos pais (v.5).
  2. A educação dos filhos da aliança deve ser de acordo com o testemunho e a lei que o SENHOR instituiu (v.5). Portanto, a educação dos filhos da aliança não pode ser contrária à Palavra de Deus.
  3. A educação dos filhos da aliança tem efeito sobre as gerações futuras (v.6). É bom lembrar: se falhamos na educação dos nossos filhos, isso tem consequências sobre as gerações futuras.
  4. A educação dos filhos da aliança tem como objetivos: a glória de Deus (v.4), a confiança em Deus (v.7) e a obediência aos mandamentos de Deus (v.8).
Além das Escrituras, as confissões reformadas também apontam para uma educação que glorifique a Deus. Por exemplo, podemos notar alguns princípios no Catecismo de Heidelberg:
No Dia do Senhor 38, ao confessarmos o que cremos sobre o 4º Mandamento, lemos sobre “escolas cristãs” que devem ser mantidas. Há algumas discussões sobre o significado de escolas cristãs nesse contexto. Alguns entendem tratar-se de escolas cristãs como sendo o lugar onde as crianças da aliança devem ser educadas, outros pensam que estas palavras se referem ao treinamento de ministros da Palavra, conforme o contexto da resposta parece indicar, ou seja, escolas cristãs seriam o que chamamos de seminários hoje. Mas mesmo adotando esta interpretação, temos um princípio aqui: a igreja deve investir na preparação de ministros da Palavra. O objetivo desse investimento na preparação de ministros da Palavra é que a Palavra de Deus seja bem entendida. Portanto, pela mesma razão, os ouvintes também devem ser preparados para ouvir a instrução da Palavra de Deus. Essa foi uma preocupação do reformador João Calvino, conforme menciona Edson Pereira Lopes ao falar sobre alguns pressupostos educacionais de Calvino:
“O pressuposto básico de Calvino é que a ignorância é a mãe da heresia. Assim,     podemos vê-lo questionar como poderia um povo inculto em todas as áreas absorver os     ensinamentos de homens bem preparados. O povo também tinha de ser bem preparado     para poder receber e apreciar as instruções. Sendo assim, Calvino começou a preparar     seu trabalho inicial. A solução era começar a educar as crianças”. 1
Então, à luz do que confessamos no Dia do Senhor 38, do Catecismo de Heidelberg (confira também as perguntas 158 a 160 do Catecismo Maior de Westminster a respeito da pregação da Palavra), fica implícito que devemos educar nossos filhos da melhor maneira possível, para que, no futuro, se chamados por Deus para o ministério da Palavra, estejam preparados para cursar um seminário e servir como ministros da Palavra; e se forem chamados para outra vocação, estejam prontos para servir de igual modo, na vocação para a qual Deus lhes chamar, bem como capacitados para ouvir as instruções da Palavra de Deus.
No Dia do Senhor 12, confessamos sobre nossa responsabilidade como cristãos. Como membros de Cristo, partilhamos Sua unção para poder sermos profetas, sacerdotes e reis (1 Pe 2.9). A implicação disso é que devemos estar bem preparados para, pela graça de Deus, servi-lo neste mundo da melhor maneira possível. O que nos leva à conclusão de que nossos filhos precisam de uma educação que lhes permita cumprir da melhor maneira possível seus ofícios como profetas, sacerdotes e reis a fim de glorificar a Deus em suas vocações. Este é um princípio do sacerdócio de todos os santos. Quanto a isso, a idéia dos Reformadores, bem como das Igrejas Reformadas é que não deve haver separação entre o ensino seja de matemática, geografia ou história e o ensino das Escrituras. A educação tem de ser vista como um todo, visando o aperfeiçoamento do homem para a vocação para a qual Deus o chamou. A criança deve ser educada para cumprir um papel na sociedade de tal modo que atinja o fim principal do homem, isto é, “glorificar a Deus e gozá-lo para sempre” (Breve Catecismo de Westminster).
No Dia do senhor 48 (confira também a pergunta 191 do Catecismo Maior de Westminster), confessamos a respeito do significado das palavras de Jesus na oração modelo: “venha o teu reino”. Podemos ver aqui a necessidade de crentes bem preparados para serem instrumentos nas mãos do Senhor. Por exemplo, em nossas orações devemos pedir a Deus que destrua as obras do diabo, todo poder que se levante contra Ele e toda conspiração contra a Sua Palavra. Sabemos que Deus não irá fazer isso por meio de anjos, mas que Ele usa sua Igreja, que é “coluna e baluarte da verdade”. A implicação disso é que devemos ser crentes conhecedores dessas conspirações contra a Palavra de Deus e estar preparados para, na força que o Senhor dá, destruí-las com a própria Palavra de Deus. E isso deve acontecer em todas as áreas. Portanto, mais uma vez somos levados à conclusão de que devemos educar nossos filhos de tal maneira que eles possam ser nutridos com a verdade, servir a Deus neste mundo e manifestar, assim, a presença de Seu reino.
Agora que já vimos a educação dos nossos filhos a partir da Palavra de Deus e das nossas confissões, podemos vê-lo a partir do voto que fizemos no batismo de nossos filhos2. Vocês lembram que quando nossos filhos receberam o santo batismo nos foram feitas quatro perguntas? As duas últimas são as seguintes:
  • Vocês prometem e assumem a responsabilidade, como pais desta criança, de instruí-la no ensino já mencionado, logo que for capaz de entendê-lo?
  • Vocês prometem fazer todo o possível para que esta criança seja instruída naquele ensino?
Mas que ensino é esse sobre o qual lemos nas duas perguntas? É o ensino mencionado na segunda pergunta: “O ensino do Novo e do Antigo Testamento, o verdadeiro e completo ensino da salvação”. Que resposta vocês deram? Creio que vocês disseram: Sim! Então isso quer dizer que no batismo dos seus filhos vocês fizeram um voto de educá-los de acordo com as Escrituras (Antigo e Novo Testamentos). Esse voto é uma coisa muito séria, algo que fizemos diante do Deus da aliança e do povo da aliança. A implicação disso é que se abandonamos a educação dos nossos filhos, transferindo a responsabilidade para o Estado ou para a escola particular, estaremos violando o 3º Mandamento — e este mesmo nos diz que, se o violarmos, Deus não nos terá por inocentes 3.
É bom lembrar também que esta responsabilidade que os pais assumiram no batismo de seus filhos é mencionada no Regimento das Igrejas Reformadas do Brasil em seu artigo 48, que trata sobre o compromisso dos pais que têm filhos batizados. O artigo 48, diz:
“Os pais devem instruir seus filhos batizados na doutrina da palavra de Deus, como prometeram quando seus filhos foram batizados, também, se for possível, através de educação escolar baseada nesta doutrina” 4.
Então a que conclusão chegamos? A Escritura ensina que os pais devem educar seus filhos para Deus, de acordo com a Palavra de Deus, visando a glória de Deus. Nossas confissões apontam para uma educação que redunde em pessoas preparadas para servir a Deus e ao próximo. Nós fizemos votos, no batismo de nossos filhos, de que os educaríamos de acordo com “o ensino do Novo e do Antigo Testamento”. Portanto, se os pais abandonam sua responsabilidade de educar seus filhos conforme a Escritura e para a glória de Deus, eles podem estar desobedecendo a Palavra de Deus, contrariando sua confissão e violando o terceiro mandamento. Então, mais uma vez, temos de reconhecer que a educação dos nossos filhos é um assunto muito sério. Nossos filhos precisam de uma educação baseada na Verdade, tendo como centro a Pessoa de Cristo e sua Palavra, uma educação que prepare nossos filhos a cumprirem sua vocação a fim de servirem a Deus e ao próximo, uma educação que os habilite a entender bem as instruções da Palavra de Deus, uma educação que redunde na Glória de Deus, e espero que vocês pais reconheçam sua responsabilidade em prover tal educação.
No próximo artigo, iremos analisar os perigos a que expomos nossos filhos quando os submetemos a uma educação humanista. Por hora, o encorajo a orar reconhecendo sua responsabilidade, buscando perdão por sua omissão e a ajuda do Senhor, a fim de possa dar a seus filhos uma educação para a glória de Deus.
Pr. Elienai B. Batista serve a Igreja Reformada em Cabo Frio RJ, como Ministro da Palavra e dos Sacramentos. É esposo de Maralice e pai de Israel, Joabe e Abner.
Notas:
1 LOPES, Edson Pereira. O conceito de teologia e pedagogia na Didática Magna de Comenius. São Paulo: Editora Mackenzie, 2003.
2 Uma referência às perguntas usadas na Forma para administrar o santo batismo aos filhos, usada pelas Igrejas Reformadas do Brasil.
3 Conforme o Manual Litúrgico (São Paulo: Casa Editora Presbiteriana. 2ª edição, 1992), utilizado pela Igreja Presbiteriana do Brasil, os pais, membros desta igreja, assumem o mesmo compromisso, no batismo de seus filhos. No manual existem três formas para o batismo de crianças e entre as perguntas feitas aos pais, podemos destacar as seguintes: 
 “Prometem ensinar-lhe a ler para que leia por si mesmo a Santa Escritura; orar por ele e com ele; servir-lhe, vocês mesmos, de bom exemplo de piedade e religião, e esforçar-se, por todos os meios designados por Deus, para criá-lo na disciplina e correção do Senhor?”
    “Prometem encaminhá-la pelas santas veredas da cruz, servindo-lhe vocês mesmos de exemplo de piedade, e envidar todos os esforços para livrá-la de más companhias e de maus exemplos; ensinar-lhe a Bíblia, e trazê-la com vocês à igreja regularmente; ensiná-la a adorar o Senhor com reverência e a estimar como irmãos os demais membros da igreja?”
4 No Manual Presbiteriano (São Paulo: Editora Cultura Cristã, 15ª edição, 1999), no tópico  sobre os Princípios de Liturgia, lemos o seguinte sobre batismo infantil:
    Art. 11 – Os membros da Igreja Presbiteriana do Brasil devem apresentar seus filhos para o batismo, não devendo negligenciar essa ordenança. § 1º – No ato do batismo os pais assumirão a responsabilidade de dar aos filhos a instrução que puderem e zelar pela sua boa formação espiritual, bem como fazê-los conhecer a Bíblia e a doutrina presbiteriana como está expressa nos Símbolos de Fé.
Fonte: www.reformahoje.org/ 

Reforma, uma necessidade constante

Rev. Hernandes Dias Lopes

A Reforma não foi um desvio do cristianismo primitivo, mas uma volta a ele. A igreja havia se desviado das veredas da verdade e a Reforma foi um movimento para colocar a igreja de volta nesses trilhos. Um dos lemas da Reforma era: “Igreja Reformada, sempre reformando”. O que isso significa? Não significa certamente que a igreja precisa ir se amoldando à cultura prevalecente de cada época e sim que a igreja precisa voltar-se continuamente às Escrituras para não se conformar com a cultura prevalecente de cada época. Não é a cultura que julga as Escrituras, mas as Escrituras que julgam a cultura. O primeiro pilar da Reforma foi “Só as Escrituras”.
Muitas igrejas herdeiras da Reforma, seduzidas pelo encanto das filosofias engendradas pelo enganoso coração humano, afastaram-se daquelas verdades essenciais da fé cristã e capitularam-se às novidades heterodoxas. Queremos, aqui, apontar alguns desses desvios:
1. A doutrina sem vida. A Reforma trouxe não apenas uma volta à Palavra, mas, também, uma volta à piedade. Uma das exigências dos puritanos era: doutrina pura e vida pura. Não podemos separar a doutrina da vida, a teologia da prática, a ortodoxia da piedade. A vida piedosa é consequência da sã doutrina. Uma igreja trôpega na Palavra jamais estará na vanguarda da luta pelo restabelecimento dos valores morais absolutos.
2. A vida sem doutrina. Se a doutrina sem vida deságua em racionalismo estéril, a vida sem doutrina desemboca em misticismo histérico. Esse foi o equívoco do Pietismo alemão do século dezoito, que cansado da doutrina sem vida, foi para o outro extremo e pleitiam vida sem doutrina e acabou caindo num experiencialismo heterodoxo. Há muitos indivíduos que, em nome da fé evangélica, deixam de lado as Escrituras e buscam uma espiritualidade edificada sobre o frágil fundamento das emoções. Buscam experiência e não a verdade. Buscam uma luz interior e não a luz que emana da verdade de Deus. Correm atrás de gurus espirituais, guias cegos, que arrastam consigo, para o abismo do engano, seus incautos seguidores.
3. O liberalismo teológico. O liberalismo teológico nasceu do ventre do racionalismo iluminista. O homem, cheio de empáfia, decidiu que só poderia aceitar como verdade o que a razão humana pudesse explicar. O resultado imediato foi a negação das grandes doutrinas do cristianismo como a criação, a redenção e a ressurreição. A Bíblia foi retalhada, mutilada e torcida. Os seminários que outrora formaram teólogos de renome e missionários comprometidos com a evangelização dos povos foram tomados de assalto por esses liberais e muitos pastores formados nesses seminários despejaram esse veneno mortífero dos púlpitos nas igrejas e o rebanho de Deus, desorientado e faminto do pão da Vida, foi disperso. Há milhares de igrejas mortas pelo mundo afora, vitimadas pelo liberalismo teológico. Precisamos entender que a verdade de Deus é inegociável. A igreja que abandona a sã doutrina morre.
4. O sincretismo religioso. O Brasil é um canteiro fértil onde floresce o sincretismo religioso. Mais e mais igrejas aderem a essa prática para atrair pessoas. Templos lotados e multidões sem conta se acotovelam em grandes concentrações públicas para buscar um milagre, uma cura ou uma experiência que lhes mitigue a angústia, que só o evangelho de Cristo pode oferecer. Precisamos de uma nova Reforma que traga de volta a igreja para a Palavra. Precisamos de seminários que não se dobrem à sedução dos liberais nem se entreguem ao pragmatismo ávido por resultados. Precisamos de pastores que amem a Cristo e sejam fiéis às Santas Escrituras para alimentar o rebanho de Deus com o trigo da verdade em vez de empanturrá-lo com a palha do sincretismo religioso. Precisamos de uma igreja bíblica, viva, santa, cheia do Espírito, alegre, vibrante e operosa. Uma igreja herdeira da Reforma e continuadora da Reforma!