sexta-feira, 3 de agosto de 2012

Sermão do Missº Veronilton Paz na Igreja Presbiteriana do Brasil em Monteiro


Veredas da Justiça: Sermões que Edificam

TEXTO: ATOS 13.1-3
Barnabé e Saulo são enviados pela igreja de Antioquia. 
[1] Ora, na igreja em Antioquia havia profetas e mestres, a saber: Barnabé, Simeão, chamado Níger, Lúcio de Cirene, Manaém, colaço de Herodes o tetrarca, e Saulo. [2] E, servindo eles ao Senhor e jejuando, disse o Espírito Santo: Separai-me, agora Barnabé e a Saulo para a obra a que os tenho chamado. [3] Então, jejuando e orando, e impondo sobre eles as mãos, os despediram.

EXÓRDIO:
          Missões está no coração de Deus, Ele foi o primeiro a enviar um missionário e foi seu Filho Unigênito Jesus para salvar os pecadores que crêem Nele (João 3.16). No Antigo Testamento o Senhor tinha um plano para todas as nações, no chamado do crente Abraão a nação de Israel deveria atrair as nações para Ele (Gn 12.3), Israel foi atraído pelas nações e praticou sua idolatria, feitiçaria e prostituição, a chamada missão centrípeta; no Novo Testamento Cristo enviou a igreja atrairia as nações e também sairia ao encontro das nações, na consumação da salvação o apóstolo João viu uma grande multidão de todas as nações. Tribos, povos e raças (Ap 7.9). Toda a Bíblia registra um propósito missionário desde Gênesis a Apocalipse. O ponto culminante nas missões é a pessoa e obra de Cristo (Atos 10.36), no qual todas as pessoas de todos os tempos são salvos por Ele, na velha aliança a salvação era pela expectativa do messias (Lucas 3.15), na Nova Aliança a chegada do messias cumpria todas as promessas dos profetas, salmos e escritos, hoje a pregação não é outra senão Jesus como Senhor e salvador de todas as nações. Nos quatro evangelhos os evangelistas narram a vida e obra de Jesus, Lucas no livro de Atos narra que Ele continuou fazendo por meio da igreja. A igreja já nasce missionária em Pentecostes onde os irmãos falaram línguas de outras nações e assim muitas nações ouviram o evangelho de Cristo (Atos 2.4, 7-11). Hoje somos uma igreja missionária?

NARRAÇÃO:
          Os três primeiros versículos do capitulo treze do livro de Atos dos Apóstolos são um resumo da obra missionária da igreja de     Antioquia, enviando missionários para ir a outras localidades, onde Cristo ainda não fora anunciado, Antioquia foi um centro missionário e gentios vieram ao conhecimento de Cristo por meio da obra daquela igreja (). A igreja de hoje precisa promover missões como a igreja de Antioquia, sendo uma igreja que pregava e vivia o evangelho, pois os discipulos de cristo foram chamados de cristãos pela primeira vez em Antioquia (Atos 11.26), a igreja foi chamada de Católica (universal) também primeiramente em Antioquia pelo Bispo Ignácio da Antioquia segundo relata o livro histórico Didaquê. Esta igreja foi marcante pela sua vivencia cristã. Nós queremos tratar nestes versículos sobre algumas características desta igreja com o tema:

TEMA: CARACTERÍSTICAS DE UMA IGREJA MISSIONÁRIA (ANTIOQUIA)

1.      É UMA IGREJA FERTILIZADA POR DEUS. V.1
“Ora, na igreja em Antioquia havia profetas e mestres, a saber: Barnabé, Simeão, chamado Níger, Lúcio de Cirene, Manaém, colaço de Herodes o tetrarca, e Saulo”.

          Esta igreja tinha uma operação gloriosa de Deus nela, havia nela profetas e mestres, por exemplo Simão por sobrenome níger, um homem de pele escura (níger é o termo latino para negro) bem provavelmente da África, ou seja esta igreja era tão fértil que alcançou pessoas fora da sua localidade. Manaém era um cristão que era irmão de criação do Herodes Antipas, ou seja, até no império romano esta igreja entrou com o evangelho de Cristo. Esta igreja tinha ainda dois grandes missionários Saulo e Barnabé que levaram muitos gentios ao conhecimento de Cristo (Atos 13.44-47). A igreja de Cristo precisa evangelizar, a igreja foi criada para crescer e não para estagnar, o problema é que muitas igrejas estão inchando de pecado e carnalidade, enchem templos de pessoas vazias de Deus. Como diz Hernandes Dias Lopes “muitos pregadores estão preocupados mais em entreter bodes do que alimentar ovelhas”. O crescimento da igreja deve ser qualitativo e quantitativo.

2.      É UMA IGREJA QUE SERVE AO SENHOR. V.2a, 3a
“E, servindo eles ao Senhor e jejuando [...]”. “Então, jejuando e orando [...]”.
          O termo “Servindo eles ao Senhor” no termo grego é diakonia e significa serviçal, servo; a igreja de Antioquia era uma igreja de servos, veja que nela havia profetas (grego Kêrysso, pregador), mestres (didakaio, professor, ensinador), mas aqueles homens não se agarravam a seus títulos eclesiásticos para serem reconhecidos como tal, eles simplesmente serviam ao Senhor. Hoje vemos muitos homens usando títulos eclesiásticos, mas seu coração é insensível às almas perdidas que clamam por salvação. Muitas vezes criados elitizados dentro de igrejas e sem nenhuma compaixão pelas pessoas que caminham para o inferno. Muitos estão indo aos seminários para depois de quatro anos ter um emprego garantido, enchem-se de teologia e esquecem de ter um contato direto com a Palavra de Deus. Acham que a piedade é fonte de lucro (I Timóteo 6.5), abrir igrejas é visar lucro e salvação de pessoas. Podem ser teólogos, mestres, mas falta ser servo. Ser servo é imitar Jesus em suas palavras, ações e reações. As palavras de Cristo eram espírito e vida (João 6.63), suas ações tinham íntima compaixão pelos que se perdem (Marcos 8.2). Jesus reagiu à crucificação não dizendo palavras contra os que o pregaram na cruz, mas disse “Pai perdoa porque não sabem o que fazem” (Lucas 23.34). Servir a Deus é buscar parecer com Jesus.
           Eles jejuavam e oravam no seu serviço ao Senhor, isto era para eles não uma programação eclesiástica, mas uma prática diária e costumeira conforme nos apresenta Lucas, o médico amado nas passagens de Atos 2.42, 3.1, 4.24, 6.4, 10.31, 14.23, 28.8.   
A igreja de Antioquia era uma igreja que servia ao Senhor. Nós estamos servindo ao Senhor ou apenas aos nossos próprios desejos e vontades?

3.      É UMA IGREJA CONTROLADA PELO ESPÍRITO SANTO. V.2B
“[...] disse o Espírito Santo: Separai-me, agora Barnabé e a Saulo para a obra a que os tenho chamado”.
          Naquela igreja o Espírito Santo dava as ordens e eles obedeciam, Ele determinou quais eram os missionários que queria na sua obra. O Espírito Santo é soberano em suas ações e a nós resta obedecer. Ele é quem chama os missionários para sua obra, mas muitas vezes a escolha de missionários, presbíteros, diáconos é ditado pela política eclesiástica, aqueles que concordam comigo eu dou tudo, aos que discordam de mim não dou nada e ainda persigo. Isto é o efeito de uma igreja que não está cheia, nem andando no Espírito. Muitas vezes o Espírito Santo quer usar alguém na igreja e nós tentamos atrapalhar aquela pessoa para que não cresça. Conta-se uma história de um homem chamado Joaquim, crente e não sabia ler, tinha vontade de pregar, evangelizar, no evangelismo, todos, inclusive o pastor sempre dava um jeito de colocar ele com alguém que sabia que não ia deixá-lo falar. Em um evangelismo intensivo numa cidade vizinha, seu Joaquim foi o primeiro a chegar para pegar o carro que levava os irmãos a localidade do evangelismo. Ao separar as duplas colocou o irmão com um professor que não deixava seu Joaquim falar e nem orar. Na hora do almoço seu Joaquim saiu escondido e foi evangelizar sozinho, encontrou a casa de um médico chamado Dr. Carlos Aires, pediu para entrar e começou a falar sobre Jesus, o doutor chamou a esposa e filhos para ouvirem o irmão falar, ao sair convidou-os para o culto na Escola em frente. No culto estava lá o médico e sua família, procuraram o pastor e disseram que queriam entregar-se a Cristo. O pastor querendo fazer a média perguntou qual a parte da mensagem que lhes tocou, eles responderam que o que tocou eles foram as palavras de um senhor chamado seu Joaquim, aquele pastor arrogante fica envergonhado de ter tentado impedir por tanto tempo um homem de falar de Jesus. O Espírito Santo sopra onde quer (João 3.8). O Espírito Santo age como quer, onde quer e usa quem ele quer usar. Como diz o Rev. Jeremias Pereira “Deus usou a mula de Balaão e continua a usar qualquer cavalo da vida”. Não queira fazer a missão do Espírito Santo, Ele sabe fazer bem feito.
     
4.      É UMA IGREJA QUE IMPULSIONA SEUS FILHOS À SAIR DAS QUATRO PAREDES E FAZER MISSÕES. V.3b
“[...] e impondo sobre eles as mãos, os despediram”.
          A igreja impôs as mãos sobre Saulo e Barnabé e os despediram para a missão que iriam realizar, ou seja, saíram do conforto de uma igreja já formada para irem em busca de almas perdidas e pregar-lhes o caminho da salvação, o Senhor Jesus Cristo. A imposição de mãos foi uma certificação oficial que estavam separados pelo Espírito Santo para a obra. Nós oramos “venha o teu Reino”, mas muitas vezes não impulsionamos os membros da igreja para evangelizar, que é um dos sinais da sua vinda quando o evangelho chegar a todas as nações. Na grande comissão Jesus disse “Ide, portanto, e fazei discípulos de todas as nações [...]”, mas não saímos nem para o Serrote, Tingui, Sumé, deixamos de ir pregar, evangelizar, para ver futebol, novela, Faustão, Formula 1, bater papo na internet. E AINDA DIZEMOS QUE O REINO DE DEUS É PRIORIDADE PARA NÓS!. Pagamos ingresso para ver um cantor evangélico e não temos coragem de enviar um centavo para a obra missionária. E AINDA DIZEMOS QUE PRIORIZAMOS O REINO DE DEUS! A igreja tem impulsionado seus membros a sair das quatro paredes para evangelizar? Para os membros saírem para evangelizar, a liderança precisa dá exemplo, pois como podemos cobrar dos membros para saírem das quatro paredes, se a liderança não evangeliza, não sai para pregar o evangelho. Precisamos sair das quatro paredes. A ordem não é da Igreja Presbiteriana do Brasil, é de Jesus! “Ide e pregai o evangelho a toda criatura” (Marcos 16.15). Muitas vezes as igrejas estão é incentivando os jovens a se acomodarem, na minha época de mocidade, eu me converti no sábado 11/05/1996 e no domingo já estava evangelizando com a mocidade, nossas programações era igual mesa de rico, tinha de tudo um pouco, lazer, sociais, intercâmbios com outras mocidades, nós apesar de solteiros, éramos ocupado, pois estudávamos, trabalhávamos e mesmo assim conseguimos evangelizar Monteiro inteiro. Hoje poucos jovens evangelizam, estamos falhando e não os incentivando a sair das quatro paredes. Levante do banco, pessoas para evangelizar não falta, deixemos de sermos insensíveis, muitas vezes estamos fechados em nosso mundinho onde tudo conspira a nosso favor, na Vila Santa Maria onde uma vez fomos evangelizar em 1997, chegando ali percebemos em uma casa uma mulher que tinha um punhado de filhos e na sua casa não tinha nada. Precisamos ficar ali conversando enquanto uma das pessoas saiu de moto para providenciar alimentos para aquela família, muitos de nós nunca precisou passar por isso e não sabe o que é deparar com alguém maltratado pela vida. Fizemos uma viagem a cidade de São José do Belmonte-PE e fomos conhecer o Projeto Fonte no Deserto, uma Zona Rural que tinha tudo para ser um fracasso, mas Jesus fez nascer uma fonte naquele sertão castigado pela estiagem, Jesus fez surgir uma igreja no Sítio Inveja e se espalhou por uma vasta região, chegando na cidade de São José do Belmonte, Carmo e indo até Brejo Santo no Ceará e nas proximidades do Sítio Inveja conhecemos uma mulher chamada Edite que entregou-se a Cristo, sua casa era de taipa e uma parte coberta de palha e o Rev. Neto de bicicleta ia evangelizar e dona Edite nos relatou “a felicidade que tenho hoje não troco por nenhuma mansão”. Tudo isso porque alguém ousou sair da sua zona de conforto e foi para o lugar que Deus queria que ele estivesse. Meu irmão saia das quatro paredes, deixe de ser egoísta, se já foi alcançado pela graça de Deus, leve o conhecimento de Cristo a outros que inda não o conhecem.
   
CONCLUSÃO:
          Na exposição desta mensagem vimos que a igreja de Antioquia tinha algumas características que eram: 1. Uma igreja fertilizada por Deus; 2. Era uma igreja que servia ao Senhor; 3. Era uma igreja controlada pelo Espírito Santo e; 4. Era uma igreja que impulsionava seus membros a saírem das quatros paredes e fazerem missões. Pergunto nossa igreja é missionária? Temos sido férteis gerando filhos na fé? Temos de fato servido ao Senhor? Nossa Vida tem sido controlada pelo Espírito Santo? Incentivamos pessoas a sair de dentro do circulo eclesiástico para evangelizar?

APLICAÇÃO:
1.      Deus nos desafia agora a ter uma vida com Deus e para Deus nos envolvendo na obra missionária.
2.      Oramos por nós pela igreja, por missões e pelo missionários?
3.      Vamos aos campos missionários ou contribuímos com missões?
Musica: Nc 312; desafio e oração.

BIBLIOGRAFIA:
GENEBRA, Bíblia de. Edição Atualizada e Ampliada. Campinas-SP: Editora Cultura Cristã, 2010
LEONARD, John. Além do Brasil: Missões. 5ªEd. Patrocínio-MG: CEIBEL, 1992.
SEVERO, Rev. Marcos. Missões por Toda Parte. 1ªEd. Santa Bárbara D’Oeste-SP: SOCEP, 2008.
GEORGE, Sherron K. A igreja Missionária. 1ªEd. Patrocínio-MG: CEIBEL, 1990.
CATÓLICO, Pequeno Catecismo. 1ªEd. São Paulo-SP: Editora de Ajuda Igreja que Sofre.
GEORGE, Sherron K. A Igreja Evangelística. 1ª Ed. Patrocínio-MG, 1989.

Data: 02/08/2012  

Relativismo, absolutismo e a burrificação da teologia brasileira


Durante dois anos dediquei parte do meu tempo para discutir com relativistas ateus acerca da existência de uma verdade universal e absoluta. Sabe o que eu descobri? Que algumas pessoas têm uma vontade enorme de discordar, mesmo em face das maiores evidências. A segunda grande lição que tirei foi que o relativista é um debatedor desleal; como debater a verdade com alguém que crê que todas as proposições são igualmente verdadeiras (não havendo, conseqüentemente, nenhuma verdade?).

Mas se há (e eu tenho absoluta certeza que há!) uma verdade acerca da verdade, é que ela independe da nossa opinião sobre ela. Antigamente a humanidade achava que a terra era plana, mas a crença daquele homem primitivo e medieval não pode mudar a verdade de que a terra é redonda. Eles estavam bem intencionados, mas fracassaram. A verdade sempre existirá, independente do modo como nos relacionamos com ela.

Neste mundo pós-moderno com sua porteira aberta para o absurdo, não faltam cidadãos politicamente corretos para tratar de convencer-nos que a moralidade, por exemplo, nada mais é do que uma convenção social. Não existe um comportamento certo ou errado; não há regras exteriores a nós para se cumprir, tudo começa e termina em nós mesmos. Contudo, mesmo o maior dos relativistas abominará a idéia de ter uma esposa “relativamente fiel”. Neste caso, ele está absolutamente seguro que a fidelidade é um padrão moral legítimo, verdadeiro. Para muitos, todo comportamento é correto, até o dia que um tarado pervertido estupre a sua filhinha indefesa. Isso acontece porque a verdade nem sempre é evidente em nossas ações, mas pode ser percebida em nossas reações.

A exegese e a hermenêutica também tem sofrido influencia do relativismo. Há uma multidão de crentes relativizados, tratando de convencer-nos que o balão é azul, roxo e verde ao mesmo tempo. Para estes pseudo-pensadores, as palavras de Jesus tem um milhão de interpretações possíveis (e igualmente válidas). Quanta frescura! É claro que a Bíblia às vezes usa metáforas, analogias e parábolas, mas nestes casos o sentido do texto é claro. Do mesmo modo, há inúmeras passagens que são literais, e o sentido destas palavras é igualmente claro.

Às vezes penso que esta idéia burrificada de que cada um deve interpretar a Bíblia a sua maneira, e que verdades contradizentes podem ser igualmente verdadeiras é produto do péssimo sistema educativo brasileiro. A grande maioria dos alunos do ensino médio é incapaz de interpretar textos simples! Entende a gravidade do problema? Os nossos queridos relativistas morais e religiosos são, em grande parte, vítimas deste processo.

Por tudo isso que eu afirmo sem medo de errar: “não é o excesso de intelectualidade que está sufocando a igreja brasileira, mas a ausência dela”. E nestes dias confusos, quando os homens “chamam o mal de bem e o bem de mal”, nada pode ser mais normal do que uma multidão de ignorantes sendo aclamados como pensadores e filósofos, enquanto os verdadeiros pensadores são relegados ao anonimato. A burrice virou sinônimo de intelectualidade, e aqueles que usam o cérebro e contrariam as convenções pós-modernistas são chamados de intolerantes e irracionais.

Lamentável, desconcertante, triste, mas… não menos verdadeiro.

Fonte: Napec
 

Como o Cristão deve relacionar-se com as ideologias políticas? Com a Palavra, André Bieler

O Cristianismo reformado foi e permanece fator determinante para o desenvolvimento econômico, democrático e cultural dos povos, importa sublinhar que ele só pode desempenhar esse papel se os crentes, nutridos da forte Palavra de Deus para regeneração do mundo, mantiverem, diante dos sistemas econômicos e políticos, a distância crítica que lhes prescreve o evangelho. E isso é válido para os crentes de todas as confissões cristãs. Se os protestantes têm, a tal respeito, responsabilidade particular em virtude de sua história, não possuem por si mesmos qualquer predisposição especial de que possam prevalecer-se.

Ora, tal missão crítica é sempre difícil de exercer, e por vezes perigosa. Quando é fielmente realizada, defronta oposições, porque questiona os interesses egoístas dos indivíduos e dos grupos sociais, seja qual for a classe da população a que pertençam. Já se observou o fato no âmbito político. E é ainda mais verdadeiro no campo econômico, onde se jogam mais diretamente ainda os interesses de cada indivíduo.

Foi exatamente essa experiência que adquiriram, depois da igreja primitiva e, desde o inicio da história, os cristãos reformados, e especialmente os pastores quando mantinham a indispensável independência da prédica que lhes ordena o Evangelho.

[...] Na política, libertado dos crivos ideológicos habituais, o crente, de fato, não se situa à esquerda, nem á direita, nem ao centro, de modo incondicional, porque seus critérios de julgamento têm outra origem. Está, destarte, equipado para engajar-se temporariamente na cidade, a fim de realizar, com outros irmãos de facção diversa da sua, o programa que lhe parece momentaneamente mais justo e urgente para construir uma sociedade viável e duradoura, na precariedade da nossa situação.

BIÉLER, André. In: A Força Oculta dos Protestantes. Traduzido por Paulo Manoel Protasio.  São Paulo, SP: Editora Cultura Cristã, 1999. Capítulo IV: A Ética Cristã em luta com as ideologias contemporâneas, pp. 143 e 164.

Rodrigo Ribeiro

Fonte: www.ump-da-quarta.blogspot.com

quinta-feira, 2 de agosto de 2012

MUNDO EM FILIGRANAS

Por Jorge Fernandes Isah

Tenho que uma das coisas na qual os crentes mais negligenciam é a afirmação de Paulo: "Porquanto a inclinação da carne é inimizade contra Deus, pois não é sujeita à lei de Deus, nem, em verdade, o pode ser" (Rm 8.7). Em outras palavras, Paulo está dizendo o que Tiago diz: "Não sabeis vós que a amizade do mundo é inimizade contra Deus? Portanto, qualquer que quiser ser amigo do mundo constitui-se inimigo de Deus" (Tg 4.4).


Em nome da intelectualidade, tolerância, do politicamente correto, indolência, comodismo, pieguice, e de tantas outras desculpas esfarrapadas, a igreja tem mantido, infelizmente, uma íntima relação com o mundo. O que vale dizer que as trevas ocuparam o lugar que deveria ser da luz, sucumbindo à escuridão completa, na ilusão de que estão a favorecer ou colaborar com a luz. O mundanismo na igreja é como uma peste, um flagelo, uma maldição que se propaga como um vírus letal, o qual consumirá e afasta-la-á do seu propósito: a grande comissão, a obra de proclamação do Evangelho, e a consequente salvação de almas.


Muitos vão taxar-me de fundamentalista (no sentido de reacionário, retrógado, extremista, medieval), mas a própria palavra de Deus afirma que os crentes devem se considerar em constante guerra com o mundo, não se conformarem com ele (Rm 12.2), nem o amarem, pois ao que ama o mundo, o amor do Pai não está nele (1Jo 2.2). Logo, se você quer agradar a Deus sendo obediente aos seus mandamentos, terá de ser reacionário, inflexível, ortodoxo e extremista em defender e viver a Escritura, opondo-se ao pecado. Ou não somos de Deus? Ou não sabemos que o mundo está no maligno? (1Jo 5.10). Não há de se ser condescendente, nem manter-se em uma relação amigável, nem compartilhar qualquer tipo de interesses com aqueles que estão no mundo, os quais são filhos de satanás, e esforçam-se em compartilhar e promover os ideais, princípios e conceitos anti-evangelho de Cristo, que os levarão à morte definitiva, e a quem pactuar com eles. Ouça o que o Senhor nos diz: "Dei-lhes a tua palavra, e o mundo os odiou, porque não são do mundo, assim como eu não sou do mundo" (Jo 17.14), pois "Se vós fôsseis do mundo, o mundo amaria o que era seu, mas porque não sois do mundo, antes eu vos escolhi do mundo, por isso é que o mundo vos odeia" (Jo 15.19); "Se o mundo vos odeia, sabei que, primeiro do que a vós, me odiou a mim" (Jo 15.18). O que lhe parece? É possível se enganar? A sentença de Cristo deixa dúvida? Ou será que negligenciamos a Sua advertência fazendo-nos aliados do inimigo, julgando-nos amigos de Deus? "Ninguém pode servir a dois senhores; porque ou há de odiar um e amar o outro, ou se dedicará a um e desprezará o outro" (Mt 6.24). A maior tolice que o crente pode cometer é acreditar que o mundo será sincero, pacífico e justo; antes ele é igual ao seu mentor, o qual "foi homicida desde o princípio, e não se firmou na verdade, porque não há verdade nele. Quando ele profere mentira, fala do que lhe é próprio, porque é mentiroso, e pai da mentira" (Jo 8.44), e "não vem senão a roubar, a matar, e a destruir" (Jo 10.10). Cuidado! Por certo é o que ele deseja ardentemente, e, insistente, não se furtará a usar de todos os meios para lançar-nos em definitivo no abismo.
 
E tudo o que estiver em disposição de resistir a qualquer dos preceitos bíblicos, os quais Deus decretou como o padrão de vida cristã, representará inimizade para com Ele, ainda que aparente insignificância, e faça-se inofensivo. Você ouve piadas imorais e ri? Não se importa em ser desleal? Nem de falar mal do colega de trabalho ou escola? Já olhou para alguém e sentiu-se superior a ele? Ou desprezou-o por não acompanhar o seu raciocínio?... Não estou a falar de prostituição, adultério, furto, vícios, assassinato, e coisas do gênero, mas dos valores cristãos mais elementares que são desprezados e combatidos diariamente, e pelos quais você não se importa. Falo dos filigranas, dos mais tênues desejos que dividimos com o mundo: orgulho, inveja, vaidade, cobiça, trapaças (que se acalentam de uma forma tão intensa e muitas vezes passam despercebidas), e mais, da sua ordem pedagógica de nos sujeitar ao fim por ele pretendido. O salmista nos adverte: "Bem-aventurado o homem que não anda segundo o conselho dos ímpios, nem se detém no caminho dos pecadores, nem se assenta na roda dos escarnecedores. Antes tem o seu prazer na lei do Senhor, e na sua lei medita de dia e de noite" (Sl 1.1-2) . O que isso quer dizer? Que o crente não deve:

1) Ouvir o conselho do ímpio.
2) Deter-se em seu caminho, antes afastar-se dele. Se não for possível, deixá-lo passar a galope.

3) Assentar na roda dos escarnecedores, e assim, se fazer e agir como um zombeteiro. O alerta é evidente: manter a distância máxima de tudo o que se refere ao mundo, no sentido daquilo que o mundo tem, produz e doutrina como elementos que o levarão ao pecado e a desobediência. Porém, o crente deve ter prazer na Lei do Senhor, e nela meditar dia e noite, incessantemente. Este é o antídoto para não comungar com o mundo: o temor e reverência a Deus, o deleite e a alegria em se sujeitar à Sua vontade expressa claramente na Lei.

Para muitos é possível ser um crente sem amar a Lei de Deus; e, ultimamente, a igreja tem sido vítima (há casos em que é fomentadora) da idéia de que é possível servir a Cristo odiando a Lei. Mas como o Senhor pode concordar que alguém se intitule Seu filho se odeia e despreza aquilo que criou? É coerente? Não. E demonstra o quão pouco razoável e entendido é quem assim pensa e age à revelia da revelação divina, a qual nos diz que a Lei é espiritual (Rm 7.14), santa, justa e boa (Rm 7.12); o que não significa que seremos capazes de cumpri-la. Cristo fez isso por nós, para nos salvar (Gl 3.13). E a prova de que sou salvo é o amor à Lei (Sl 119.163), e desejar no íntimo cumpri-la, ainda que não o faça completamente. A minha alegria é obedecer a palavra de Deus, e a minha tristeza é não ser capaz de realizá-la, por isso a necessidade de arrepender-me e clamar o perdão divino.

Aparte:[Em Romanos 7, Paulo faz um verdadeiro tratado do domínio da lei sobre o homem. Ele fala de duas leis: a Lei santa e justa que revela o pecado, e pela qual Cristo morreu, e com Ele também morremos para o pecado; e a lei do pecado que "habita em mim. Porque eu sei que em mim, isto é, na minha carne, não habita bem algum; e com efeito o querer está em mim, mas não consigo realizar o bem... Ora, se eu faço o que não quero, já o não faço eu, mas o pecado que habita em mim" (Rm 7.17-18, 20). Ou seja, a Lei que revelou-me o pecado, pelo qual seria condenado, foi pregado na cruz do Calvário por Cristo, que cumpriu-a na carne por mim; o que me tornou livre da condenação da Lei, liberto do seu jugo. Contudo, deve-se anelar o desejo de observa-la, em sujeição à vontade de Deus, como Seu filho, o qual tem de ser santo como é santo o Pai celestial (Lv 20.26).

Por outro lado, o apóstolo aponta a incapacidade de se livrar completamente da lei do pecado, a qual serve-se da nossa carne. É o remanescente da nossa natureza corrupta em conflito com o Espírito que habita em nós, opondo-se um ao outro (Gl 5.17). Desta forma, se não reconheço o meu pecado, como me aceitarei pecador? E como buscarei em Deus a santidade e o perdão? Porém, alguns enganam-se a si mesmos dizendo que não têm pecado (1Jo 1.8), ou desprezam-no como algo irrelevante e, assim, poderiam achar que "tanto faz"; com o seguinte argumento: já que não se está livre do pecado, porque não pecar? Esse é um pensamento ímpio e que nada tem a ver com o legítimo propósito de Deus para os Seus filhos. Mesmo que não realizemos toda a Lei, devemos amá-la e desejar sinceramente obedecê-la, como a expressão da vontade divina aos eleitos] .

Claro que há posições divergentes. Muitos crêem que os cristãos poderão se apropriar daquilo que de bom a cultura, a ciência, a educação seculares podem nos oferecer. Creio ser isso evidente, pois somos beneficiados pela tecnologia, pela medicina, pelos avanços em todas as áreas do conhecimento humano, os quais acontecem apenas e somente pela graça e vontade de Deus. Não vejo o porquê de se rejeitar aquilo que o mundo realiza de bom, e que são dádivas do Criador para os homens (para todos os homens, porque Ele usará ímpios para abençoar os santos e vice-versa). Contudo, há de se ter uma separação do crente com as práticas que afrontam a Deus. Ambientes, programações e interesses que infringem a Lei Moral devem ser abominados e repelidos prontamente (bares, danceterias, e a maioria dos programas de tv, por exemplo).

Infelizmente, muitos cristãos têm se deixado seduzir pelos apelos do mundo e andando segundo o seu curso, segundo o espírito que opera a desobediência nos homens (Ef. 2.2); e, progressivamente têm permitido que o pecado entre em suas vidas e as consuma. O que acaba por transformar muitas igrejas em "parques de diversão" do diabo, onde ele se diverte zombando dos que o consideram inofensivo, dos incautos e estultos que são ludibriados pela perversão que há em seus corações, pela soberba dos seus ceticismos, ou das suas crendices.
Ao considerarem algumas práticas malignas como ingênuas, como fruto da "evolução cultural da humanidade", não se apercebem de que são dominados e tragados pela astúcia do prazer ilícito, pelo desejo obsceno, pela imoralidade e, anestesiados, têm suas mentes e corações cauterizados pelo pecado (a mente que deveria ser de Cristo, ainda continua sendo a mente governada pelo pecado, irregenerada), desprezam a Deus, ainda que tentem se convencer de que O servem, quando são escravos de si mesmos e do maligno.

A Bíblia alerta-nos a não descuidar com o pecado, o qual é sutil e malévolo, e quer sempre nos ver rebelar, nos ver insurgir contra Deus, o que, no final, será a nossa destruição.

E é assim que o mundo quer, que os filigranas sejam tecidos ao nosso redor e nos aprisionem, e, enfim, não restará mais nada além dos grilhões, e o Inferno.

Fonte: Kálamo
 

Cinco Afirmações Incontestáveis (Predestinação)

Predestinação: Cinco Afirmações

Incontestáveis


predestinação_incontestável

John Stott

NOTA: Artigo extraído da antiga versão do site www.monergismo.com; referencia fundamental em teologia reformada – não sabemos informar se o artigo consta no novo site monergismo.

John Stott, um dos mais conhecidos ministros anglicanos, inicia seu estudo citando o Artigo XVII da confissão de fé anglicana, conhecida como “29 Artigos da Religião”.
*****

Comentário Sobre Romanos 8:28-30

A predestinação para a vida é o eterno propósito de Deus, pelo qual (antes de lançados os fundamentos do mundo) tem constantemente decretado por seu conselho, a nós oculto, livrar da maldição e condenação os que elegeu em Cristo dentre o gênero humano, e conduzi-los por Cristo à salvação eterna, como vasos feitos para honra. Por isso os que se acham dotados de um tão excelente benefício de Deus, são chamados segundo o propósito de Deus, por seu Espírito operando em tempo devido; pela graça obedecem à vocação; são justificados gratuitamente; são feitos filhos de Deus por adoção; são criados conforme à imagem de seu Unigênito Filho Jesus Cristo; vivem religiosamente em boas obras, e, enfim, chegam, pela misericórdia de Deus, à felicidade eterna”. (XVII Artigo de Religião – Predestinação e Eleição).

“Sabemos que Deus age em todas as coisas para o bem daqueles que o amam, dos que foram chamados de acordo com o seu propósito. Pois aqueles que de antemão conheceu, também os predestinou para serem conformes à imagem de seu Filho, a fim de que ele seja o primogênito entre muitos irmãos. E aos que predestinou, também chamou, também justificou; aos que justificou também glorificou” (Romanos 8:28-30). Nestes dois versículos Paulo esclarece o que quis dizer no versículo 28 ao referir-se ao “propósito” de Deus, segundo o qual ele nos chamou e age para que tudo contribua para o nosso bem. Ele analisa o “bem” segundo os parâmetros de Deus, bem como o seu propósito de salvação, através de cinco estágios, desde que a idéia surgiu em sua mente até a consumação do seu plano na glória vindoura. Segundo o apóstolo, esses estágios são: presciência, predestinação, chamado, justificação e glorificação. Primeiro há uma referência a aqueles que Deus de antemão conheceu. Essa alusão a “conhecer de antemão”, isto é, saber de alguma coisa antes que ela aconteça, tem levado muitos comentaristas, tanto antigos como contemporâneos, a concluir que Deus prevê quem irá crer e que essa presciência seria a base para a predestinação. Mas isso não pode estar certo, pelo menos por duas razões. A primeira é que neste sentido Deus conhece todo mundo e todas as coisas de antemão, ao passo que Paulo está se referindo a um grupo específico. Segundo, se Deus predestina as pessoas porque elas haverão de crer, então a salvação depende de seus próprios méritos e não da misericórdia divina; Paulo, no entanto, coloca toda a sua ênfase na livre iniciativa da graça de Deus. Assim, outros comentaristas nos fazem lembrar que no hebraico o verbo “conhecer” expressa muito mais do que mera cognição intelectual; ele denota um relacionamento pessoal de cuidado e afeição. Portanto, se Deus “conhece” as pessoas, ele sabe o que passa com elas [138]; e quando se diz que ele “conhecia” os filhos de Israel no deserto, isto significa que ele cuidava e se preocupava com eles.[139] Na verdade Israel foi o único povo dentre todas as famílias da terra a quem Javé “conheceu”, ou seja, amou, escolheu e estabeleceu com ele uma aliança. [140] O significado de “presciência” no Novo Testamento é similar. “Deus não rejeitou o seu povo [Israel], o qual de antemão conheceu”, isto é, a quem ele amou e escolheu (11:2). [141] À luz deste uso bíblico John Murray escreve: “’Conhecer’... É usado em um sentido praticamente sinônimo de ‘amar’... Portanto, ‘aqueles que ele conheceu de antemão’... é virtualmente equivalente a ‘aqueles que ele amou de antemão”.[142] Presciência é “amor peculiar e soberano”. [143] Isto se encaixa com a grande declaração de Moisés: “Não vos teve o Senhor afeição, nem vos escolheu, porque fôsseis mais numerosos do que qualquer povo... mas porque o Senhor vos amava...”. [144] A única fonte de eleição e predestinação divina é o amor divino.

Segundo, aqueles que [Deus] de antemão conheceu, ou que amou de antemão, também os predestinou para serem conformes à imagem de seu Filho, a fim de que ele seja o primogênito entre muitos irmãos (29). O verbo predestinou é uma tradução de proorizõ que significa “decidiu de antemão” (BAGD), como se vê em Atos.4:28 (“Fizeram o que o teu poder e tua vontade haviam decidido de antemão que acontecesse”). É, pois, evidente que o processo de tornar-se um cristão implica uma decisão; antes de ser nossa, porém, tem de ser uma decisão de Deus. Com isso não estamos negando o fato de que nós “nos decidimos por Cristo”, e isso livremente; o que estamos afirmando é que, se o fizemos, é só porque, antes disso, ele já havia “decidido por nós”. Esta ênfase na decisão ou escolha soberana e graciosa de Deus é reforçada pelo vocabulário com o qual ela está associada. Por um lado, ela é atribuída ao “prazer” de Deus, a sua “vontade”, “plano” e “propósito”, [145] e por outro lado, já existia “antes da criação do mundo” [146] ou “antes do princípio das eras”. [147] C. J. Vaughan resume esta questão nas seguintes palavras:

Cada um que se salva no final só pode atribuir sua salvação, do primeiro ao último passo, ao favor e à ação de Deus. O mérito humano tem de ser excluído: e isto só pode acontecer voltando às origens do que foi feito e que se encontra muito além da obediência que evidencia a salvação, ou mesmo da fé a que ela é atribuída; ou seja, um ato de espontâneo favor da parte daquele Deus que antevê e pré-ordena desde a eternidade todas as suas obras. [148]

Este ensino não pode se minimizado. Nem a Escritura nem a experiência nos autoriza faze-lo. Se apelarmos para a Escritura, veremos que no decorrer de todo o Antigo Testamento se reconhece ser Israel “a única nação na terra” a quem Deus decidiu “resgatar para ser seu povo”, escolhido para ser sua “propriedade peculiar”; [149] e em todo o Novo Testamento se admite que os seres humanos são por natureza cegos, surdos e mortos, de forma que sua conversão é impossível, a menos que Deus lhes dê vista, audição e vida. Nossa própria experiência confirma isso. O Dr. J. I. Packer, em sua excelente obra O Evangelismo e a Soberania de Deus,[150] aponta que, mesmo que neguem isso, a verdade é que os cristãos crêem na soberania de Deus na salvação. “Dois fatos demonstram isso”, ele escreve. “Em primeiro lugar, o crente agradece a Deus pela sua conversão. Ora, por que o crente age assim? Porque sabe em seu coração que Deus foi inteiramente responsável por ela. O crente não se salvou a si mesmo; Deus o salvou. (…) Há um segundo modo pelo qual o crente reconhece que Deus é soberano na salvação. O crente ora pela conversão de outros... roga a Deus para que opere neles tudo quanto for necessário para a salvação deles”. Assim os nossos agradecimentos e a nossa intercessão provam que nós cremos na soberania divina. “Quando estamos de pé podemos apresentar argumentos sobre a questão; mas, postados de joelhos, todos concordamos implicitamente”. [151] Mesmo assim há mistérios que permanecem. E, como criaturas caídas e finitas que somos, não nos cabe o direito de exigir explicações ao nosso Criador, que é perfeito e infinito. Não obstante, ele lançou luz sobre o nosso problema de tal maneira a contradizer as principais objeções que são levantadas e a mostrar que a predestinação gera conseqüências bem diferentes do que se costuma supor. Vejamos cinco exemplos: 1. Dizem que a predestinação gera arrogância, uma vez que (alega-se) os eleitos de Deus se gloriam de sua condição privilegiada. Mas o que acontece é justamente o contrário: a predestinação exclui a arrogância, pois afinal, não dá para entender como Deus pode se compadecer de pecadores indignos como eles! Humilhados diante da cruz, eles só querem gastar o resto de suas vidas “para o louvor da sua gloriosa graça” [152] e passar a eternidade adorando o Cordeiro que foi morto. [153]2. Dizem que a predestinação produz incerteza e que cria nas pessoas uma ansiedade neurótica quanto a serem ou não predestinadas e salvas. Mas não é bem assim. Quando se trata de incrédulos, eles nem se preocupam com a sua salvação – até que, e a não ser que, o Espírito Santo os convença do pecado, como um prelúdio para a sua conversão. Mas, se são crentes, mesmo que estejam passando por um período de dúvida, eles sabem que no final a sua única certeza consiste na eterna vontade predestinadora de Deus. Não há nada que proporcione mais segurança e conforto do que isso. Como escreveu Lutero ao comentar o versículo 28, a predestinação “é uma coisa maravilhosamente doce para quem tem o Espírito”. [154]3. Dizem que a predestinação leva à apatia. Afinal, se a salvação depende inteiramente de Deus e não de nós, argumentam, então toda responsabilidade humana diante de Deus perde a razão de ser. Uma vez mais, isso não é verdade. A Escritura, ao enfatizar a soberania de Deus, deixa muito claro que isso não diminui em nada a nossa responsabilidade. Pelo contrário, as duas estão lado a lado em uma antinomia, que é uma aparente contradição entre duas verdades. Diferentemente de um paradoxo, uma antinomia “não é deliberadamente produzida; ela nos é imposta pelos próprios fatos... Nós não a inventamos e não conseguimos explicá-la. Não há como nos livrar dela, a não ser que falsifiquemos os próprios fatos que nos levaram a ela”. [155] Um bom exemplo se encontra no ensino de Jesus quando declarou que “ninguém pode vir a mim, se o Pai... não o atrair” [156] e que “vocês não querem vir a mim para terem vida”. [157] Por que as pessoas não vão a Jesus? Será porque não podem? Ou é porque não querem? A única resposta compatível com o próprio ensino de Jesus é: “Pelas duas razões, embora não consigamos conciliá-las”. 4. Dizem que a predestinação produz complacência e gera antinomianos. Afinal, se Deus nos predestinou para a salvação eterna, por que não podemos viver como nos agrada, sem restrições morais, e desafiar a lei divina? Paulo já respondeu esta questão no capítulo 6. Aqueles que Deus escolheu e chamou, ele os uniu com Cristo em sua morte e ressurreição. E agora, mortos para o pecado, eles renasceram para viver para Deus. Paulo escreve também em outro lugar que “Deus nos escolheu nele antes da criação do mundo, para sermos santos e irrepreensíveis em sua presença”. [158] Ou melhor, ele nos predestinou para sermos conformes à imagem de seu Filho (29). 5. Dizem que a predestinação deixa as pessoas bitoladas, pois os eleitos de Deus passam a viver voltados apenas para si mesmos. Mas o que acontece é o contrário. Deus chamou um único homem, Abraão, e sua família apenas, não para que somente eles fossem abençoados, mas para que através deles todas as famílias da terra pudessem ser abençoadas. [159] Semelhantemente, a razão pela qual Deus escolheu seu Servo, a figura simbólica de Isaías que vemos cumprida parcialmente em Israel, mas especialmente em Cristo e em seu povo, não foi apenas para glorificar Israel, mas para trazer luz e justiça às nações. [160] Na verdade estas promessas serviram de grande estímulo para Paulo (como deveriam ser também para nós) quando ele, num ato de grande ousadia, decidiu ampliar sua visão evangelística para alcançar os gentios. [161] Assim, Deus fez de nós seu “povo exclusivo”, não para nos tornarmos seus favoritos, mas para que fôssemos suas testemunhas, “para anunciar as grandezas daquele que os chamou das trevas para a sua maravilhosa luz”. [162]Portanto, a doutrina da predestinação divina promove humildade, não arrogância; segurança e não apreensão; responsabilidade e não apatia; santidade e não complacência; e missão, não privilégio. Isso não significa que não existam problemas, mas é uma indicação de que estes são mais intelectuais do que pastorais. E o ponto que Paulo quer enfatizar no versículo 29 é, com toda certeza, pastoral. Tem a ver com dois propósitos práticos da predestinação de Deus. O primeiro é que nós devemos ser conformes [viver de conformidade com] à imagem de seu Filho. Ou, dito da forma mais simples possível, o eterno propósito de Deus para seu povo é que nos tornemos como Jesus. O processo de transformação começa aqui e agora, em nosso caráter e conduta, por meio da obra do Espírito Santo, [163] mas só será completado e aperfeiçoado quando Cristo vier e nós o virmos, [164] e quando nossos corpos se tornarem como o corpo de sua glória. [165] O segundo propósito da predestinação de Deus é que, como resultado de nos tornarmos conformes à imagem de Cristo, ele passe a ser o primogênito entre muitos irmãos, desfrutando da comunhão da família como também da prerrogativa de ser o primogênito. [166]Vamos agora à terceira afirmação de Paulo: E aos que predestinou, também chamou (30a). O chamado de Deus é a aplicação histórica da sua predestinação eterna. Seu chamado chega às pessoas por meio do evangelho; [167] quando esse evangelho é anunciado a elas com poder e elas lhe respondem com a obediência da fé, aí é que se sabe que Deus as escolheu. [168] Assim a evangelização (o anúncio do evangelho), longe de se tornar supérflua em virtude da predestinação de Deus, é indispensável, pois é exatamente ela o meio proporcionado por Deus para que o seu chamado chegue às pessoas e desperte a sua fé. Fica, pois, evidente que aqui, quando Paulo fala do “chamado de Deus”, não se trata daqueles apelos generalizados do evangelho, mas sim da convocação divina que levanta os espiritualmente morto e lhes dá vida. Geralmente se chama isso de chamado “efetivo” de Deus. Aqueles a quem Deus dirige esse chamado (30) são os mesmos que “foram chamados de acordo com o seu propósito” (28). Em quarto lugar, aos que chamou, também justificou (30b). O chamado efetivo de Deus capacita aqueles que o ouvem a crer; e aqueles que crêem são justificados pela fé. Como a justificação pela fé é um assunto dominante nos capítulos anteriores desta carta de Paulo, não há necessidade de se repetir o que já foi dito, a não ser talvez enfatizar que a justificação é muito mais do que simples perdão ou absolvição, ou mesmo aceitação; é uma declaração de que nós, pecadores, agora somos justos aos olhos de Deus, pois ele nos conferiu o status de justos, que na verdade trata-se da justiça do próprio Cristo. É “em Cristo”, em virtude da nossa união com ele, que nós fomos justificados. [169] Ele se fez pecado com o nosso pecado, para que nós pudéssemos nos tornar justos com a sua justiça. [170]Quinto, aos que justificou, também glorificou (30c). Já por diversas vezes Paulo usou o substantivo “glória”. Trata-se essencialmente da glória de Deus, a manifestação do seu esplendor, a glória da qual todos os pecadores estão destituídos (3:23), mas que se regozijam na esperança de recobrar (5:2). Paulo promete também que se participarmos dos sofrimentos de Cristo iremos participar também da sua glória (8:17), e que a própria criação irá um dia experimentar a liberdade da glória dos filhos de Deus (8:21). Agora ele usa o verbo: aos que justificou, também glorificou. Nosso destino é receber corpos novos em um mundo novo, e ambos serão transfigurados com a glória de Deus. Muitos estudiosos percebem que o processo da santificação, que ocorre entre a justificação e a glorificação, foi omitido no versículo 30. No entanto, ele está implícito ali, tanto na alusão a sermos conformados à imagem de Cristo, como na preliminar necessária para nossa glorificação. Pois “santificação é glória iniciada; glória é santificação consumada”. [171] Além disso, tão certo é esse estágio final que, embora ainda se encontre no futuro, Paulo o coloca no mesmo tempo aoristo, como se fosse um fato passado, tal como tem usado para os outros quatro estágios que já são passado. É o assim chamado “passado profético”. James Denney escreve que “o tempo da última palavra é impressionante. É a mais ousada antecipação de fé que o próprio Novo Testamento contém”. [172]

Vimos aqui, portanto, as cinco afirmações incontestáveis apresentadas por Paulo. Deus é retratado como alguém que se move irresistivelmente de um estágio ao outro; de uma presciência e predestinação eternas, através de um chamado e uma justificação históricos, para a glorificação final de seu povo em uma eternidade futura. Faz-nos lembrar uma cadeia composta de cinco elos inquebráveis.

NOTAS:

[136] Jeremias 29.11.
[137] At 2.23; cf. 4.27.
[138] Sl. 1.6; 144.3.
[139] Os 13.5.
[140] Am 3.2.
[141] Cf. 1 Pe 1.2.
[142] Murray, vol. I, p. 317.
[143] Ibid., p. 318.
[144] Dt 7.7s.; cf. Ef 1.4s.
[145] Ef 1.5,9,11; 3.11.
[146] Ef 1.4.
[147] 1 Co 2.7; 2 Tm 1.9; cf. 1 Pe 1.20; Ap 13.8.
[148] Vaughan, 9. 163.
[149] 2 Sm 7.22ss; cf. Êx 19.3ss; Dt 7.6; 10.15; 14.2; Sl 135.4.
[150] Edições Vida Nova, 1961.
[151] Ibid., pp. 13ss.
[152] Ef 1.6,12.14.
[153] Ap 5.11ss.
[154] Lutero (1515), p. 371.
[155] Packer, op. cit., p. 21.
[156] Jo 6.44.
[157] Jo 5.40.
[158] Ef 1.4; cf 2 Tm 1.9.
[159] Gn 12.1ss.
[160] Is 40.1ss; 49.5ss.
[161] Ver; por exemplo, At 13.47; 26.23.
[162] 1 Pe 2.9ss.
[163] 2 Co 3.18.
[164] 1 Jo 3.2ss.
[165] 1 Co 15.49; Fp 3.21.
[166] Cf. Cl 1.18.
[167] 2 Ts 2.13s.
[168] 1 Ts 1.4s.
[169] Gl 2.17.
[170] 2 Co 5.21.
[171] Bruce, p. 168.
[172] Denney, p. 652.

Fonte: STOTT, John. A Mensagem de Romanos. Trad. Silêda e Marcos D S Steuernagel. 1ed. São Paulo: ABU Ed., 2000. 528p.; pp. 300-306.

Para saber mais: http://www.abub.org.br/editora/livros/bibliafalahoje.htm
 
Fonte: www.olharreformado.com