Por Rev. Alderi Sousa Matos (Ministro Presbiteriano e Historiador)
Missionário em Mato Grosso e professor do Seminário de Campinas
Philip Landes nasceu em Botucatu, Estado de São Paulo, no dia 22 de junho de 1883. Foi o segundo dos dez filhos do Rev. George Anderson Landes e D. Rebecca Margaret N. Sheeder Landes. No dia do seu nascimento, estava hospedada em sua casa a Sra. Alexandrina Teixeira da Silva Braga, da qual recebeu os primeiros cuidados. Era esposa do candidato ao ministério João Ribeiro de Carvalho Braga e mãe do futuro Rev. Erasmo Braga, então com seis anos. Os pais do recém-nascido haviam chegado ao Brasil menos de dois anos antes, em agosto de 1881, indo fundar o trabalho presbiteriano em Botucatu, situada no extremo oeste do estado, na fronteira das terras habitadas pelos indígenas.
Em novembro de 1885, a família Landes se transferiu para Curitiba, onde o futuro missionário viveu sua infância. Às vezes acompanhava o pai em suas viagens evangelísticas. Estudou até 1896 na Escola Americana, dirigida pelas professoras Mary P. Dascomb e Elmira Kuhl. No ano seguinte, deu continuidade aos estudos no Mackenzie College, em São Paulo. Em 1898, a família seguiu em gozo de férias para os Estados Unidos, onde o filho continuaria os estudos preparatórios e começaria a cursar o Wooster College, no Estado de Ohio. Em 1902, com 19 anos, o jovem voltou ao Brasil com a família, passando dois anos como vigilante e professor de inglês e álgebra na Escola Americana, em São Paulo.
Regressou a Wooster em 1905, concluindo o “college” dois anos mais tarde. Seguiu então para o Seminário Teológico de Princeton. Segundo suas próprias palavras, ele jamais pensou na possibilidade de fazer outra coisa na vida senão pregar o evangelho. Lembrava-se que, quando criança em Curitiba, costumava pregar aos animais recolhidos em um estábulo nos fundos de sua casa. Em 1910, o seminário lhe conferiu o grau de bacharel em teologia, e mais tarde, durante suas férias missionárias, o de mestre em teologia. Recebeu ainda o grau de mestre em artes da Universidade de Princeton. Foi ordenado ao ministério no dia 13 de maio de 1910.
Ao deixar o Seminário de Princeton, assumiu o pastorado de uma pequena igreja e matriculou-se na Escola de Medicina da Universidade Cornell, em Nova York, acreditando que o duplo título de pastor e médico lhe daria possibilidades muito maiores de serviço no campo missionário. Além disso, inspirou-se no exemplo de sua irmã Pauline, que havia morrido inesperadamente em 1908 perto de concluir o curso de medicina. Após dois anos de estudos, atendendo aos argumentos de alguns amigos sobre a urgente necessidade de obreiros, interrompeu o curso de medicina e regressou imediatamente ao Brasil, em 1912. Seu treinamento médico se mostraria valioso nos anos seguintes. Inicialmente a Missão determinou que ele fosse auxiliar o Rev. Henry McCall em Caetité, no sul da Bahia. Cheio de entusiasmo, viajou extensamente por todo o campo, visitando locais como Carinhanha, Cocos, Santa Maria da Vitória e Bom Jesus da Lapa.
Em 16 de junho de 1915, casou-se em Vila Americana, São Paulo, com Margaret Bookwalter Hall, nascida em 1884, filha do casal Charles Moses Hall e Mary Elizabeth Miller Hall. Ele havia conhecido essa família durante os estudos no Mackenzie. Margaret, que tinha uma irmã gêmea, Julia, foi a última das irmãs Hall a se casar com um missionário presbiteriano. Seu casamento foi o último a realizar-se em Vila Magnólia, a residência dos pais em Americana. Após breve visita a Curitiba, seguiram para a longínqua Cuiabá, onde o trabalho presbiteriano havia sido iniciado recentemente pelo Rev. Franklin Floyd Graham. A cidade era uma fronteira primitiva, onde se misturavam fugitivos da justiça, garimpeiros e índios selvagens, por vezes com grande violência. Foi um grande desafio para o novo missionário e sua esposa.
Foram recebidos pela família Dias, os únicos protestantes de Cuiabá. O Sr. João Pedro Dias (1867-1930) era um cearense que havia se convertido em Recife, filiando-se à igreja congregacional. Em fevereiro de 1899, mudou-se para Cuiabá trazendo um grupo de migrantes cearenses. Era casado com Maria Dias de Melo, que lhe deu seis filhos e faleceu em 1906. Mais tarde, casou-se em segundas núpcias com Maria José Dias, com quem teve a filha Tabita. Sendo muito empreendedor, implantou a primeira companhia telefônica da cidade (1909) e a primeira usina de energia elétrica (1919). Realizava cultos em sua residência antes da chegada dos missionários presbiterianos.
O casal Landes alugou uma casa e comprou a única cama da cidade: as pessoas dormiam em redes, temendo que escorpiões, aranhas ou mesmo cobras subissem nas camas. Além das atividades pastorais, o Rev. Landes destacou-se como polemista, evangelista e professor. Quando os franciscanos começaram a atacar o protestantismo em seu semanário A Cruz, respondeu por meio da imprensa leiga. Nas colunas de um periódico da cidade, manteve memorável polêmica com D. Francisco de Aquino Corrêa, o bispo local que acabava de ser nomeado governador do estado. No interesse da causa evangélica, lecionou inglês no Ginásio do Estado, o Liceu Cuiabano, e fez muitas amizades nos círculos educacionais. Sua irmã Maud chegou em 1916 para auxiliar na área educacional. Ela fundou uma escola primária que três anos mais tarde foi transferida para Buriti, na Chapada dos Guimarães. Margaret se dedicou às famílias e às mulheres, visitando, consolando, mostrando como melhorar a alimentação, tratando de enfermidades, ensinando a ler e escrever, bem como costura e culinária.
A partir de 1917, Filipe fez de Cuiabá o ponto de irradiação do evangelho para muitas partes do estado, visitando Brotas, Rosário, Cáceres, Guia, Poconé e outros locais. Em 1919, passou a contar com a colaboração de um novo missionário, o Rev. Adam John Martin. A congregação de Cuiabá experimentou nítido crescimento, sendo organizada em igreja no dia 12 de outubro de 1920, com 26 membros professos. No dia 7 de setembro do ano seguinte, foi lançada festivamente a pedra fundamental do templo. Em 3 de janeiro de 1922, os missionários adquiriram para a missão uma esplêndida propriedade na Chapada dos Guimarães – Buriti. Pouco depois, a família Landes seguiu de férias para os Estados Unidos. Filipe fez estudos na Universidade e no Seminário de Princeton, e trabalhou como pastor assistente na Igreja Presbiteriana de Tioga, em Filadélfia.
Regressando a Cuiabá, encontraram um novo casal missionário, o agrônomo Homer Moser e sua esposa, que tinha vindo iniciar uma escola agrícola em Buriti. A Escola de Buriti iniciou modestamente suas atividades em julho de 1924. O belo templo de Cuiabá foi concluído e solenemente inaugurado. Algum tempo depois, um novo casal se uniu à equipe missionária – Rev. Charles Roy Harper e sua esposa Evelyn (1925-1927), antes de ir trabalhar no “Curso Universitário José Manoel da Conceição”, em São Paulo. Quando os Moser seguiram de licença para a pátria, a família Landes se transferiu para Buriti a fim de cuidar da fazenda e da escola. Nessa época, a igreja de Cuiabá passou a ter o seu primeiro pastor nacional, Rev. Rodolfo Anders, que foi instalado no dia 21 de abril de 1929. Com o retorno da família Moser, os Landes, após breve período em Cuiabá foram residir em Rosário Oeste, onde permaneceram por dois anos, sendo então substituídos pelo Rev. Good, um missionário solteiro.
Em maio de 1925, o Rev. Landes fundou com alguns colaboradores o periódico A Pena Evangélica. Seu primeiro redator foi José Nonato de Faria, um dos primeiros presbíteros da Igreja de Cuiabá. O jornal e outros materiais eram impressos em um equipamento doado pela escola dominical da Igreja Presbiteriana de Tioga. Seus objetivos eram combater vícios sociais, polemizar com a igreja católica e evangelizar. O Dr. Waldyr Carvalho Luz, seu ex-aluno, lembra uma história a seu respeito: certa ocasião, estando Cuiabá ameaçada de invasão pela Coluna Prestes, mobilizados os civis para defender a cidade, o Rev. Landes se apresentou nas trincheiras empunhando um fuzil. O comandante tentou dissuadi-lo argumentando que ele era clérigo e estrangeiro, ao que replicou de modo veemente dizendo que tinha família e era seu dever defendê-la e, além disso, era brasileiro, tendo nascido no Brasil, ficando com as tropas até que o perigo passou.
Um dos principais colaboradores dos missionários no trabalho evangélico era o jovem Augusto José de Araújo, que se transferira para Cuiabá em 1920. Ele se casou com Raquel, filha do Sr. João Pedro Dias, e fez os primeiros estudos para o ministério com os Revs. Charles Harper e Adam Martin. Além de trabalhar como evangelista, foi professor na escola de Buriti e colaborou com o jornal A Pena Evangélica.
Em 1930, a família teve novo período de férias nos Estados Unidos. O Rev. Filipe estudou em Hartford, Connecticut, mas, segundo a filha Pauline, não concluiu a tese de doutorado “porque não queria um grau que o colocasse acima dos seus colegas brasileiros”. Antes de regressarem ao Brasil, visitaram os velhos pais em Pasadena, Califórnia. De 1932 a 1934, o Rev. Landes trabalhou como evangelista geral da Missão, viajando por vários estados, como Santa Catarina, Goiás e Mato Grosso. Residiu em São Paulo, nas proximidades do Mackenzie, e os filhos estudaram na Escola Americana. Em 1934, foi enviado a Cuiabá a fim de resolver algumas dificuldades surgidas no seio da igreja durante o pastorado do Rev. Juvenal Batista. No mesmo ano, em 15 de setembro, iniciou o trabalho presbiteriano em Campo Grande, que teve como núcleo inicial um grupo de crentes vindos da capital do estado. Entre eles estavam José Verlangieri, Dr. Alípio de Castilho e José Fabelino. A família Landes residiu em Campo Grande até 1938, quando outra vez seguiu para os Estados Unidos em gozo de férias. Filipe fez novos estudos no Seminário de Princeton, presidido pelo Dr. John Mackay.
Em 1939 o Rev. Landes reassumiu seu posto em Campo Grande, onde permaneceria até 1940. Nessa época, o Seminário de Campinas perdeu um dedicado servidor, o Rev. Roberto Frederico Lenington. O missionário de Mato Grosso foi escolhido pela Missão Central para ocupar a vaga do colega falecido. Como professor da cadeira de História Eclesiástica, o Rev. Landes permaneceu no Seminário do Sul até o final de 1953, seis meses além do limite de sua aposentadoria. Continuou a utilizar o Manual de História da Igreja, de Albert Henry Newman, adotado pelo antecessor. Exerceu também os cargos de reitor e deão. Foi ainda um dos primeiros colaboradores da Junta de Missões Nacionais da IPB, tendo ocupado as funções de secretário executivo e presidente.
Ao retirar-se do seminário, depois de 41 anos de trabalho ativo no campo missionário, os olhos do Rev. Landes se voltaram para uma região remota de Mato Grosso, onde uma companhia imobiliária de orientação evangélica pretendia implantar a cidade de Jaciara. Quando, em conversa com o casal, o Rev. Américo Ribeiro perguntou se ainda tinham forças para enfrentar tal desafio, D. Margaret respondeu: “Eu só me lembro que tenho quase setenta anos quando olho para o espelho”. Na manhã do dia 29 de novembro de 1953, foi realizado na Igreja Presbiteriana de Campinas um culto de ação de graças pelos serviços prestados ao seminário pelo Rev. Filipe Landes e pelo Prof. Carlos Cristóvão Zink. O pregador da ocasião, Rev. José Borges dos Santos Júnior, falou sobre “O conceito cristão da aposentadoria”.
Ao se aposentarem, os Landes foram residir em Jandira, São Paulo. Em 1965, o casal comemorou as bodas de ouro com a presença de muito familiares. Diz a filha Pauline: “A fé da minha mãe era simples e serena, como um hino. Meu pai confiava no cuidado constante de Deus e no fato de Deus ‘cumprir o seu propósito’, nas famílias, em toda a criação e na história. Ele falou dessas coisas para sua família reunida”. O Rev. Filipe Landes faleceu vitimado por um câncer no dia 27 de julho de 1966, aos 83 anos, no Hospital Samaritano, em São Paulo. Nos seus últimos anos, trabalhou incansavelmente para consolidar a Igreja Presbiteriana de Jandira, levantando recursos para a construção do templo, pregando e visitando. Sua esposa faleceu em 16 de maio de 1979, aos 95 anos, em São José dos Campos, onde residiu com a filha Mary Elizabeth e o genro. Seu verso bíblico predileto era Filipenses 2.3 e seu hino favorito, “Preciosas são as horas” (NC 128).
O Rev. Landes foi um valente defensor da concepção reformada acerca do batismo, tendo escrito dois livros sobre o assunto: Estudos Bíblicos sobre o Batismo (1938) e Estudos Bíblicos sobre o Batismo de Crianças (1947). Publicou em inglês uma valiosa biografia de Simonton: Ashbel Green Simonton: model Pioneer missionary of the Presbyterian Church of Brazil (1956). Em 1970, seu nome foi dado ao instituto bíblico da Missão Evangélica Caiuá, em Dourados (MS). O casal Landes teve quatro filhos, todos nascidos em Cuiabá: Pauline – “Polly” (1916), George (1919), Mary Elizabeth –“Bibette” (1921) e Philip (1926)
Pauline foi casada com o Rev. George Chalmers Browne (1915-1988), nascido na China, filho de missionários. Foi ordenado em 1940, em Wooster, Ohio, pouco depois de se casar com Pauline. Após um período de pastorado e estudo nos Estados Unidos e de trabalho missionário na China, vieram para o Brasil em 1951. Serviram em Jataí (1951-1955), Chapecó (1957-1959) e em Buriti, onde substituíram o casal Moser. A seguir, trabalharam com a Confederação Evangélica do Brasil, em São Paulo, na área de literatura e alfabetização (1962-1965). Foram então para Recife, onde atuaram na Cruzada ABC – Ação Básica Cristã, um projeto apoiado pelo governo e subsidiado pela Usaid. Indo para Goiânia, trabalharam com o Departamento de Educação Básica de Adultos (Deba), da Confederação Evangélica, e com o Mobral. Por fim, realizaram trabalho missionário em Moçambique e Guiné-Bissau (1975-1981), voltando então para os Estados Unidos. Pauline reside em St. Petersburg, na Flórida, e é autora de vários livros. Sua filha Elizabeth é casada com o engenheiro Maurício Dias e reside em São Paulo, onde dirige o curso de idiomas Unique Business Language Center.
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