A expressão semper reformanda tem sido traduzida de modo a significar “sempre mudando” e deturpada no interesse da mudança pela mudança. Para muitos, significa que tudo — desde o que acreditamos, o modo como nos comportamos em uma cultura que muda rapidamente, até à maneira como “organizamos a igreja” — está sujeito à revisão e reinvenção em cada geração. A expressão costumava ser usada por cristãos liberais para justificar a adequação da mensagem aos tempos, mas agora os evangélicos argumentam que é essencial para a sobrevivência do Cristianismo que nos harmonizemos com a cultura mutável se quisermos salvar a igreja da extinção.
Temos observado essa ideia ganhar força nas últimas décadas. Os líderes e membros da igreja estimulam a “mudança” como um sinal de “integridade” ou um elemento essencial para serem “relevantes” na geração atual. Há apelos para novas formas, métodos e estruturas para a igreja. A maioria dos chamados à inovação são impulsionados pela cultura sem Deus ao nosso redor e por nossos corações rebeldes em nosso interior. Queremos modificar a mensagem para atrair a sociedade; desejamos tornar a igreja mais “amigável” aos de fora, em vez de vê-la como a assembleia solene do povo da aliança de Deus.
Vemos esse espírito atuando na revisão das principais doutrinas bíblicas. Vozes imperativas desejam que reinterpretemos o ensino básico para acomodar a hegemonia da teoria da evolução. O abandono de um Adão histórico (ou, onde isso é admitido, a negação de que Adão foi o primeiro homem) é impulsionado por pessoas no banco que enfrentam diariamente os incômodos desafios dos seus colegas e vizinhos não-cristãos.
Esse clamor por mudança está por trás do redesenho dos limites do discipulado cristão. Quer se trate de encorajar um “discipulado secreto ou silencioso” entre os convertidos do Islã, a aceitação de novas definições de casamento para apaziguar o espírito da época, ou a tolerância de estilos de vida abertamente pecaminosos com a intenção de não julgar, observamos que o discipulado está sucumbindo à pressão externa sobre a igreja.
Isso também afetou o uso da palavra adoração. Em alguns contextos, ela é aplicada apenas à música — seja da variedade clássica ou contemporânea — e criou com ela um novo ofício na igreja: o “líder de adoração”. Outros querem deixar a palavra adoração completamente, argumentando que a adoração se aplica à “toda a vida” e não às assembleias do povo de Deus. Assim, o Dia do Senhor é como qualquer outro dia; a liturgia é substituída por “eventos de convivência”; os sermões tornam-se “conversas bíblicas”; e a ênfase das “reuniões” de domingo torna-se comunhão ou evangelização ao invés de uma assembleia pactual e adoração corporativa.
Essas inovações são contrárias ao exemplo dos reformadores, que negaram que fossem mutantes que estavam interessados na mudança pela mudança em si. No sentido estrito, eles estavam estimulando um retorno à radix, à “raiz” do Cristianismo bíblico. Eles foram acusados por seus oponentes de promover a mudança, mas a sua defesa foi que, na verdade, eles queriam conduzir a igreja de volta à Palavra de Deus. Eles imaginaram a reforma não como “fazermos mudanças” (ativo), mas como o “sermos transformados” (passivo). Em outras palavras, quando falamos sobre a reforma, pensamos no Senhor que nos reforma e na Escritura que é o seu meio de reforma.
O que acontece quando aplicamos a Escritura e nossas confissões à questão da adoração? O Novo Testamento retoma a linguagem do Antigo Testamento ao chamar a assembleia de povo de Deus. Os cristãos primitivos se reuniam no dia do Senhor com o povo do Senhor para ouvir a sua Palavra e oferecer orações. Pedro descreve como chegamos a Deus quando nos reunimos como pedras vivas em um templo — Deus está presente de uma maneira especial onde o seu povo se encontra. O culto público com a sua proclamação da Palavra é para Deus e para o seu povo da aliança e faz esses últimos serem edificados na mais santa fé (1 Coríntios 14). Os incrédulos podem estar presentes e estar sob convicção ao verem a obra da Palavra na vida dos santos.
Desde os primeiros dias, os cristãos cantavam bem como oravam. O Antigo Testamento até mesmo incentiva o povo de Deus a usar instrumentos na adoração (Salmos 33.2-3). Instrumentos de todos os tipos certamente contribuem para o canto cristão, e a música é um dom singular e belo de Deus. No entanto, o uso de instrumentos pode ter um impacto negativo, às vezes: eles podem manipular erroneamente as emoções das pessoas, podem se sobressair aos louvores do povo de Deus reunido, ou podem inibir a participação congregacional na adoração. A experiência musical em si pode ser adorada como um ídolo. Assim, devemos ter cuidado para não fazer uso do que é digno, auxiliar e útil — a música — e torná-la absoluta. Devemos ter cuidado para que a música não ocupe o lugar de Deus em nossa adoração.
Esses exemplos ilustram a necessidade de estarmos constantemente perguntando se as tradições herdadas ou práticas novas são bíblicas. Precisamos considerar se nossas práticas estão ajudando ou inibindo a nossa adoração a Deus. Onde nossas práticas contribuem com algo, precisamos ter cuidado para não as considerarmos em demasia e assim sacrificarmos os meios de graça ordinários: a Palavra, a oração e os sacramentos.
Dados Sobre o Autor: Dr. William W. Goligher é ministro sênior na Tenth Presbyterian Church em Filadélfia, Pensilvânia. Ele é autor de The Jesus Gospel e Joseph: The Hidden Hand of God.
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