quinta-feira, 9 de setembro de 2010

A Soteriologia de S. João 10




“E Jesus andava passeando no templo, no alpendre de Salomão. Rodearam-no, pois, os judeus, e disseram-lhe: Até quando terás a nossa alma suspensa? Se tu és o Cristo, dize-no-lo abertamente. Respondeu-lhes Jesus: Já vo-lo tenho dito, e não o credes. As obras que eu faço, em nome de meu Pai, essas testificam de mim. Mas vós não credes porque não sois das minhas ovelhas, como já vo-lo tenho dito. As minhas ovelhas ouvem a minha voz, e eu conheço-as, e elas me seguem; e dou-lhes a vida eterna, e nunca hão de perecer e ninguém as arrebatará da minha mão. Meu Pai, que mas deu, é maior do que todos; e ninguém pode arrebatá-las da mão de meu Pai”João 10. 23-29.
Eu cresci com uma imagem bem negativa do que seria o Calvinismo. Minhas objeções contra as Doutrinas da Graça se baseavam em preconceitos, os quais, por sua vez, se fundamentavam no desconhecimento, e na má informação. Não acuso meus professores de ontem de engodo, penso simplesmente isto: eram cegos guiando cegos; em outras palavras, me ensinavam sobre aquilo que desconheciam.
De certo modo, o Capítulo 10 do Evangelho de S. João muito auxiliou minha jornada teológica; senti grande surpresa ao encontrar alguém que me mostrou o próprio Cristo ensinando algo que eu abominava: a perseverança dos Santos. Até então, eu sempre havia visto nesta doutrina uma tentativa carnal para alguns crentes justificarem algum modo de vida relapso, ou liberal. Quero lembrá-los, como escrevi no parágrafo anterior, que meu fundamento era o preconceito e a ignorância, e vice-verso (por isso, minha objeção se ‘esquecia’ que boa parte dos maiores cristãos de todos os tempos acreditava na Perseverança dos Santos!). Mas, eis, agora, que o próprio Cristo se revela diante de mim com uma promessa de Segurança Eterna.
E não só isso. Nas breves palavras contidas nos versos 23 a 29, todos os chamados Cinco Pontos do Calvinismo são ensinados, e não só a Perseverança. Nestas palavras encontro Cristo me ensinando sobre a Depravação da Natureza Humana, e sobre a Eleição Livre e Soberana de Deus; sobre o Chamado Eficaz, a Expiação Definida, e a Segurança Eterna das ovelhas. Nestas palavras de Cristo há a mais doce melodia que os ouvidos humanos jamais ouviram; se eleitos. De tempos em tempos, sempre me debruço sobre estas linhas, relendo-as, devorando-as, como verdadeiro alimento e consolo para minha alma.
Por isso, muito me dói ver como algumas pessoas buscam ofuscar a luz que emana destas linhas sagradas. Estou convencido de que somente o preconceito, e a falta de conhecimento teológico, podem impedir alguém de compreender a clareza do que Jesus está ensinando aqui. Ainda assim, não consigo deixar de me surpreender o quanto as pessoas podem ir longe a fim de negar o que está diante de seus olhos.
Mas, temo ainda não ter falado do tema central deste artigo. Vez em quando, tenho encontrado pessoas que tentam arminianizar estas palavras de Jesus. Se lhes perguntam algo como: “Não é verdade que em João 10 Jesus ensina que a salvação jamais pode ser perdida?”, estas pessoas engenhosamente respondem: “Não é bem assim. Jesus realmente fala que ninguém pode tirar suas ovelhas de Suas mãos, mas não nega que tais ovelhas possam fugir por livre escolha”. O argumento é engenhoso, admito, mas sua engenhosidade não o torna um milésimo verdadeiro. Como pretendo demonstrar, trata-se de um argumento engenhoso em sua superfície, mas, completamente irracional e antibíblico em sua essência.
Quero começar, porém, dando um passo atrás, retomando – e comprovando – minha afirmação de que nestas palavras de Cristo pode-se encontrar todas as nuances das Doutrinas da Graça, também conhecidas, por questões históricas, como Calvinismo. Como devem saber, as Doutrinas da Graça se fundamentam em cinco premissas teológicas: a) Depravação Total; b) Eleição Incondicional; c) Expiação Definida; d) Vocação Eficaz; e, por fim, mas não menos importante, e) Perseverança do Santos; ou, Segurança Eterna dos Santos.
Como se encontram todas estas premissas em João 10?
Primeiro, a Depravação Total. Há quem afirme que o homem não é tão corrompido em sua natureza a ponto de não poder usar sua vontade para nascer de novo, crendo na Pessoa de Jesus. São pessoas que defendem arduamente o conceito de Livre Arbítrio. Na maioria dos casos, estas pessoas são grandes inimigas do Calvinismo, pois, segundo dizem, nosso ensino transforma Deus num tirano, e os homens em meros bonecos de teatro. Assim, para tais pessoas, defender o Livre Arbítrio humano é questão de primeira importância.
Mas, não há lugar para Livre Arbítrio em João 10, antes, aqui Jesus ensina que o homem é completamente incapaz de fazer a vontade de Deus, e de crer no Evangelho, a menos que seja Eleito para isto; o ensino claro de Jesus aqui é que o homem é completamente corrompido pelo pecado, o que inclui suas faculdades espirituais.
A porção bíblica que estamos analisando mais de perto, (versículos 23 a 29), nos conta sobre um passeio que Jesus dava pelo Templo de Salomão. Enquanto caminhava pelo alpendre, Cristo é abordado por um grupo de judeus, que solicitam que Ele lhes declare abertamente sua messianidade, ou, que a negasse, livrando-os da necessidade de interpretarem Sua Mensagem.
“Rodearam-no, pois, os judeus, e disseram-lhe: Até quando terás a nossa alma suspensa? Se tu és o Cristo, dize-no-lo abertamente” – versículo 24.
Gosto muito deste texto. Que ele nos mostra? Certamente está diante de nós um grupo de homens que deseja saber mais sobre Jesus. Ainda que possamos questionar sua motivação, não podemos negar que eles investigam quem é Jesus; eles querem saber o que Jesus realmente desejava ensinar. Aparentemente, este texto fornece base para a defesa do Livre Arbítrio, não é mesmo? Os advogados do Livre Arbítrio alegam que a capacidade de crer ou não está na livre vontade humana; então, os judeus deste texto bíblico, nunca estiveram tão perto da Vida Eterna quanto no momento que fizeram esta pergunta a Jesus. Isto, claro, se a lógica do Livre Arbítrio fosse verdadeira.
A Eleição foi sempre um tema de suma importância para a Reforma Protestante; a principal explicação é a necessidade de demonstrar que a Salvação é um ato da Graça Divina, e não uma recompensa pela bondade do homem. Se Deus não elegeu um povo para Si, e se Ele não fez isto por meio de uma Eleição Incondicional, então, a doutrina do “somente pela fé” é falsa, e todos deveriam retornar para os braços do Papa. Não deixa de ser interessante observar uma multidão de evangélicos lutando contra a Doutrina da Eleição, quando foi justamente ela quem os livrou das amarras do Catolicismo Romano.
Mas, qual a relação do parágrafo anterior com o tema deste artigo? É fundamental descobrir se o homem possui alguma capacidade de crer em Jesus com base em uma livre vontade. Em outras palavras, o cristão faz a si mesmo um cristão, ou é Deus quem lhe dá o privilégio? Encontramos a resposta na replica de Cristo àqueles homens.
Jesus inicia sua resposta dizendo: “Já vo-lo tenho dito, e não o credes. As obras que eu faço, em nome de meu Pai, essas testificam de mim” (v. 25).  A reclamação dos religiosos parecia bem justa: Mestre, o senhor está nos deixando no suspense, e não nos declara abertamente sua Messianidade… Queremos que o senhor fale abertamente, para que possamos crer. Nós é quem decidiremos, se cremos ou não, e exigimos que o senhor nos dê dados que possamos analisar, e com nossa liberdade, escolher ficar do seu lado, ou continuar rejeitando-o. Em outras palavras, aqueles judeus confiavam sua capacidade de escolher, de julgar – em seu “livre-arbitrio”.
Todavia, Cristo simplesmente zomba desta suposta capacidade que afirmam ter para compreender e julgar Sua mensagem. Cristo diz: fiz o que era necessário, e meus sinais provam a todos Que Eu Sou, mas você ainda assim não acreditam em Mim. E não só isso, Jesus vai mais longe e declara a causa da incredulidade daqueles homens: “Mas vós não credes porque não sois das minhas ovelhas, como já vo-lo tenho dito” (v. 26).
Vocês são incapazes de crer em Mim, em vocês não existe qualquer capacidade natural que os habilite a compreender e aceitar a minha pregação e messianidade. Vocês estão “mortos em delitos e pecados” (Efésios 2.1), e tudo que podem fazer é caminhar “segundo o curso deste mundo, segundo o príncipe das potestades do ar, do espírito que agora opera nos filhos da desobediência” (Efésios 2.2), por conseguinte “fazendo a vontade da carne e dos pensamentos” (Efésios 2.3). Não importa o quão elaborada é sua Religião, nem quão avançada a sua Ciência e Filosofia, espiritualmente, vocês estão mortos, incapazes de crer para a vida eterna, pois não são das minhas ovelhas!
Eles queriam que Jesus lhes falasse sobre Si, mas, em resposta, Cristo diz apenas isto: as ovelhas Me escutam, e se este não é o caso de vocês, então, significa que vocês não fazem parte das minhas ovelhas. Observemos que Cristo, quando diz que aqueles religiosos não faziam parte das suas ovelhas, afirma: “como já vo-lo tenho dito”. Onde Cristo disse tal coisa a eles? Certamente nos primeiros versículos do Capitulo, onde ele introduz seu tema com a Parábola das Ovelhas;
“Na verdade, na verdade vos digo que aquele que não entra pela porta no curral das ovelhas, mas sobe por outra parte, é ladrão e salteador. Aquele, porém, que entra pela porta é o pastor das ovelhas.
A este o porteiro abre, e as ovelhas ouvem a sua voz, e chama pelo nome às suas ovelhas, e as traz para fora. E, quando tira para fora as suas ovelhas, vai adiante delas, e as ovelhas o seguem, porque conhecem a sua voz.  Mas de modo nenhum seguirão o estranho, antes fugirão dele, porque não conhecem a voz dos estranhos.
Jesus disse-lhes esta parábola; mas eles não entenderam o que era que lhes dizia” (João 10.1-6)
Na parábola, Jesus apresenta a figura de um pastor que vai ao curral buscar suas ovelhas. No quadro apresentado por Cristo, há várias ovelhas, sendo que nem todas Lhe pertencem. O significado da parábola é que apenas as Suas ovelhas o seguiram, pois conhecem a Sua voz. Aquelas que não reconhecem sua voz, não Lhe pertencem, e por isso, não O seguem. Ao terminar de contar a parábola, o Evangelista escreve: “mas eles não entenderam o que era que lhes dizia”. Ou seja, eles não O escutaram, não O compreenderam, não O seguiram – logo, não eram das suas ovelhas.
E Jesus segue insistindo no fato de que suas ovelhas O escutam, e O seguem; vemos isto em outros versículos, como Ainda tenho outras ovelhas que não são deste aprisco; também me convém agregar estas, e elas ouvirão a minha voz, e haverá um rebanho e um Pastor” (v. 16). De modo que, esta certeza aprensentada por Cristo, implica na conclusão de que não ouvir Sua voz, é o mesmo que não fazer parte do rebanho de Cristo; e isto comprova a Doutrina Bíblica da Eleição, que abarca a doutrina da Depravação Total da vontade humana.
De faço, abarca a doutrina da Depravação Total da vontade humana, pois, do contrário, a capacidade de crer na mensagem de Jesus Cristo estaria no coração de cada um daqueles religiosos, e não no fato de uns serem ovelhas e outros não. Neste caso, a capacidade natural precederia ao milagre do Novo Nascimento, e então, primeiro o homem exerceria sua capacidade natural, e só depois de tornaria ovelha (Novo Nascimento). Mas, segundo Cristo, primeiro o homem precisa ser ovelha, e quando isto acontece, ele é capaz de Ouvir e Seguir o Bom Pastor.
NOTA AOS LEITORES: Devido a alguns problemas pessoais, os quais me têm impedido de seguir um cronograma fixo de atualizações, este estudo será publicado em diversas partes, juntamente com a seqüência de novos estudos da série “Antídoto Contra o Arminianismo”. Contamos com a oração dos irmãos.
“Por isso eu vos disse que ninguém pode vir a mim, se por meu Pai não lhe for concedido” (João 6.65).

Fonte: www.olharreformado.wordpress.com

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