À Lei e ao Testemunho!
Ricardo Cerni
Como já tive ocasião de ver neste livro, a questão fundamental que nos preocupa no que diz respeito ao chamado "movimento carismático" é a suficiência da Sagrada Escritura como fonte de revelação doutrinal, e como guia de nossas vidas. Se a Bíblia é suficiente para mostrar o caminho da salvação e para ordenar a nossa conduta, então não há outra luz. Por outro lado, quando alguém procura por instrução ou revelação espiritual fora da Bíblia, ou na margem dela, o que ele está dizendo, queira ou não, é que a sua confiança na Escritura é parcial e limitada.
O grande perigo da ideologia “carismática" é que, em nome de Deus, é o de receber novas divulgações de informações sobre questões de conduta e de prática, e até mesmo de doutrina. A reivindicação de uma revelação direta de Deus para o indivíduo, e não através das Escrituras e sem nenhum controle ou verificação, é uma arma perigosa contra a vida da igreja cristã. É o velho erro dos falsos profetas que imitam o "Assim diz o Senhor" dos verdadeiros profetas, sem que Deus lhes houvesse enviado. Recordamos aqui conflito com os profetas Jeremias em Jeremias 28.
No entanto, de modo algum podemos limitar a imensa riqueza e variedade das maneiras que Deus se usa para se comunicar conosco. Por um lado temos a “revelação geral", através da criação e da providência. Por outro lado, temos a verdadeira orientação do Espírito, manifestado na vida dos crentes através de fatos circunstanciais e comunhão espiritual com o Senhor. Através desta comunhão e vínculos de amor mútuo, os crentes sabem o que Deus quer que se faça. Esta é uma direção pessoal. Não se trata de revelações particulares sobre questões de interesse geral afetando a igreja em geral, mas comunicações singulares que o crente pode discernir. Assim, muitas vezes em nossas vidas, recebemos reais instruções, correções, consolos e libertação do Senhor. A palavra escrita não está diretamente envolvida nestas demonstrações, mas é claro que a riqueza da sua educação foi estabelecida em nossos corações, e isso garante que o Senhor, e não outro, é quem fala aos nossos corações.
Se perguntarmos por que existe nas igrejas de hoje a preferência por "sinais", "milagres", "dons" e "revelações", a resposta imediata é que a Palavra de Deus tem deixado de estar no centro das atenções dessas igrejas. Na verdade, não é somente isso, se trata também de um sintoma de uma doença espiritual séria, o mesmo que o apóstolo Paulo diagnosticou na igreja Corinto (1 Coríntios 1.22; 2.1-5). Crentes judeus tinham uma preferência pelos "sinais", enquanto os gentios tinham uma preferência pela "sabedoria". Mas o apóstolo não cedeu nem a um nem ao outro, porque a sua missão não era fazer maravilhosas manifestações impressionante, mas "pregar Cristo crucificado". Para o crente, basta o conhecimento de Cristo e de Sua Palavra. Todos os pedidos e desejos devem ser satisfeitos nEle. Todas as necessidades e desejos são resolvidos nEle. Quem tem o conhecimento da verdade revelada nas Escrituras não necessita de mais nada. Isto é expresso pelo salmista no maravilhoso Salmo 119. Através deste Salmo pode-se perceber a plenitude da alegria e segurança dos filhos de Deus. A Lei de Deus, ou melhor, a "instrução" de Deus (porque a palavra Torah, = lei, deriva de uma raiz que significa "ensinar", "instruir") contém todas as coisas necessárias para nossa vida presente e para nossa salvação futura. A nossa vida individual, assim como a nossa vida em comunidade, deve ser regulada pelo testemunho escrito da palavra.
Quando alguém diz "O Senhor me disse..." devemos ter cuidado. Sim, o Senhor nos fala, mas fala por meio das Escrituras, pelas verdades, pelas doutrinas, pelos exemplos, pelos princípios, e até mesmo pelo seu silêncio. Esse é o jeito de falar de Deus. Ninguém deve assumir o privilégio de ter uma "revelação especial" de Deus como os profetas e apóstolos, porque isso equivale a declarar-se fundamento da igreja (Ef 2.20), e sabemos que este fundamento já foi estabelecido. A origem da maioria das seitas heréticas se encontra precisamente nos delírios de grandeza de algum “iluminado” que se apresenta com um "Assim diz o Senhor..." quando na verdade apenas expressou sua própria ambição. Tudo o que o crente precisa saber para sua vida agora e por vir, Deus já revelou em Sua Palavra.
Também não devemos permitir que alguém manipule a nossa vida com uma falsa mensagem de Deus. Houve, e ainda haverá quem tentar conduzir nossas vidas com a falsa autoridade de uma revelação para nós. São aqueles que falam "irmãos, o Senhor me disse que você deve fazer isto e aquilo..." como se Deus não pudesse dizer a mim! Tal manipulação da Palavra de Deus tem causado grandes estragos no povo de Deus. Quantas tragédias e sofrimentos têm sofridos aqueles que deram crédito a essas palavras! Devemos manter firme o princípio de que o Senhor conhece cada um de suas ovelhas, e como o Bom Pastor, chama-os pelo nome, e trata com eles em particular. O amor e o consolo do Senhor não necessita de mediadores especiais. É verdade, o Senhor em sua sabedoria, pode usar outras pessoas para enviar-nos a Sua ajuda, mas isso nunca irá significar uma barreira ou uma mediação do caráter sacerdotal. Nosso único Sacerdote é o próprio Cristo, e nEle temos a fonte da sabedoria.
Se essas supostas revelações não são necessárias, menos ainda são os "sinais". Quando nossa confiança está na Palavra de Deus, nada pode substituí-lo. A fé não precisa de muletas para andar. Nós andamos pela fé, e não pela visão. Acreditamos na autoridade da Palavra em si mesmo. A verdade de Deus é mais evidente do que qualquer testemunho dos nossos sentidos. A exigência de sinais é prova de falta de fé na Palavra. Isso é mostrado em Mateus 12.38-39. Uma passagem de especial interesse é o de João 4.43-54 sobre a cura do filho de um homem importante em Israel. O que é importante nesta passagem é o próprio Jesus fazer diferença entre o crer nos sinais e o crer na Palavra. Jesus disse: "Se, porventura, não virdes sinais e prodígios, de modo nenhum crereis" (vs 48). O atribulado pai imediatamente entendeu a diferença e, numa rápida reação, colocou a sua confiança nas palavras de Jesus: “... o homem creu na palavra de Jesus e partiu".
Um dos problemas mais impressionantes das igrejas de nosso tempo é a importância exagerada que se dá a tudo o que o apóstolo João chama de "a concupiscência dos olhos" (1 Jo 2.16). Dentro desse fenômeno, deve registrar a importância exagerada ligada a tudo o que é sentido. Os cultos das igrejas são organizadas como se fossem um espetáculo para gratificar os sensorial. A música, a atmosfera de humor, o discurso agradável etc. É um cenário ideal para excitar os sentidos e preparar o público para assistir qualquer "sinal" ou "milagre", como por exemplo, uma suposta "cura". Enquanto isso, a necessidade da fé vai diminuindo. Quanto mais se depende dos sinais externos, menos se depende da fé. Quanto mais valor se dá aos dons, menos a Palavra é valorizada. Mas o que o Senhor nos diz é "... que creiamos em o nome de seu Filho, Jesus Cristo, e nos amemos uns aos outros, segundo o mandamento que nos ordenou" (1 Jo 3.23).
Antes de pedir sinais, antes de exibir os dons, antes de gloriarmos em milagres, estejamos certos de que nossa fé pode ser muito bem sustentada sem todas essas “ajudas”. Estejamos seguros de que a Palavra de Deus, a Escritura, é suficiente para mantermos fiéis ao Senhor, cheio de amor e gratidão por sua obra de redenção.
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Tradução: Heitor Alves
Sobre o autor: Ricardo Cerni Bisbal é pastor reformado e coordenador da Fundación Editorial de Literatura Reformada (FELiRe). Conheça a FELiRe pelo site www.felire.com.
Fonte: Este artigo é um epílogo do livro El Movimiento Carismático da editora FELiRe.
O grande perigo da ideologia “carismática" é que, em nome de Deus, é o de receber novas divulgações de informações sobre questões de conduta e de prática, e até mesmo de doutrina. A reivindicação de uma revelação direta de Deus para o indivíduo, e não através das Escrituras e sem nenhum controle ou verificação, é uma arma perigosa contra a vida da igreja cristã. É o velho erro dos falsos profetas que imitam o "Assim diz o Senhor" dos verdadeiros profetas, sem que Deus lhes houvesse enviado. Recordamos aqui conflito com os profetas Jeremias em Jeremias 28.
No entanto, de modo algum podemos limitar a imensa riqueza e variedade das maneiras que Deus se usa para se comunicar conosco. Por um lado temos a “revelação geral", através da criação e da providência. Por outro lado, temos a verdadeira orientação do Espírito, manifestado na vida dos crentes através de fatos circunstanciais e comunhão espiritual com o Senhor. Através desta comunhão e vínculos de amor mútuo, os crentes sabem o que Deus quer que se faça. Esta é uma direção pessoal. Não se trata de revelações particulares sobre questões de interesse geral afetando a igreja em geral, mas comunicações singulares que o crente pode discernir. Assim, muitas vezes em nossas vidas, recebemos reais instruções, correções, consolos e libertação do Senhor. A palavra escrita não está diretamente envolvida nestas demonstrações, mas é claro que a riqueza da sua educação foi estabelecida em nossos corações, e isso garante que o Senhor, e não outro, é quem fala aos nossos corações.
Se perguntarmos por que existe nas igrejas de hoje a preferência por "sinais", "milagres", "dons" e "revelações", a resposta imediata é que a Palavra de Deus tem deixado de estar no centro das atenções dessas igrejas. Na verdade, não é somente isso, se trata também de um sintoma de uma doença espiritual séria, o mesmo que o apóstolo Paulo diagnosticou na igreja Corinto (1 Coríntios 1.22; 2.1-5). Crentes judeus tinham uma preferência pelos "sinais", enquanto os gentios tinham uma preferência pela "sabedoria". Mas o apóstolo não cedeu nem a um nem ao outro, porque a sua missão não era fazer maravilhosas manifestações impressionante, mas "pregar Cristo crucificado". Para o crente, basta o conhecimento de Cristo e de Sua Palavra. Todos os pedidos e desejos devem ser satisfeitos nEle. Todas as necessidades e desejos são resolvidos nEle. Quem tem o conhecimento da verdade revelada nas Escrituras não necessita de mais nada. Isto é expresso pelo salmista no maravilhoso Salmo 119. Através deste Salmo pode-se perceber a plenitude da alegria e segurança dos filhos de Deus. A Lei de Deus, ou melhor, a "instrução" de Deus (porque a palavra Torah, = lei, deriva de uma raiz que significa "ensinar", "instruir") contém todas as coisas necessárias para nossa vida presente e para nossa salvação futura. A nossa vida individual, assim como a nossa vida em comunidade, deve ser regulada pelo testemunho escrito da palavra.
Quando alguém diz "O Senhor me disse..." devemos ter cuidado. Sim, o Senhor nos fala, mas fala por meio das Escrituras, pelas verdades, pelas doutrinas, pelos exemplos, pelos princípios, e até mesmo pelo seu silêncio. Esse é o jeito de falar de Deus. Ninguém deve assumir o privilégio de ter uma "revelação especial" de Deus como os profetas e apóstolos, porque isso equivale a declarar-se fundamento da igreja (Ef 2.20), e sabemos que este fundamento já foi estabelecido. A origem da maioria das seitas heréticas se encontra precisamente nos delírios de grandeza de algum “iluminado” que se apresenta com um "Assim diz o Senhor..." quando na verdade apenas expressou sua própria ambição. Tudo o que o crente precisa saber para sua vida agora e por vir, Deus já revelou em Sua Palavra.
Também não devemos permitir que alguém manipule a nossa vida com uma falsa mensagem de Deus. Houve, e ainda haverá quem tentar conduzir nossas vidas com a falsa autoridade de uma revelação para nós. São aqueles que falam "irmãos, o Senhor me disse que você deve fazer isto e aquilo..." como se Deus não pudesse dizer a mim! Tal manipulação da Palavra de Deus tem causado grandes estragos no povo de Deus. Quantas tragédias e sofrimentos têm sofridos aqueles que deram crédito a essas palavras! Devemos manter firme o princípio de que o Senhor conhece cada um de suas ovelhas, e como o Bom Pastor, chama-os pelo nome, e trata com eles em particular. O amor e o consolo do Senhor não necessita de mediadores especiais. É verdade, o Senhor em sua sabedoria, pode usar outras pessoas para enviar-nos a Sua ajuda, mas isso nunca irá significar uma barreira ou uma mediação do caráter sacerdotal. Nosso único Sacerdote é o próprio Cristo, e nEle temos a fonte da sabedoria.
Se essas supostas revelações não são necessárias, menos ainda são os "sinais". Quando nossa confiança está na Palavra de Deus, nada pode substituí-lo. A fé não precisa de muletas para andar. Nós andamos pela fé, e não pela visão. Acreditamos na autoridade da Palavra em si mesmo. A verdade de Deus é mais evidente do que qualquer testemunho dos nossos sentidos. A exigência de sinais é prova de falta de fé na Palavra. Isso é mostrado em Mateus 12.38-39. Uma passagem de especial interesse é o de João 4.43-54 sobre a cura do filho de um homem importante em Israel. O que é importante nesta passagem é o próprio Jesus fazer diferença entre o crer nos sinais e o crer na Palavra. Jesus disse: "Se, porventura, não virdes sinais e prodígios, de modo nenhum crereis" (vs 48). O atribulado pai imediatamente entendeu a diferença e, numa rápida reação, colocou a sua confiança nas palavras de Jesus: “... o homem creu na palavra de Jesus e partiu".
Um dos problemas mais impressionantes das igrejas de nosso tempo é a importância exagerada que se dá a tudo o que o apóstolo João chama de "a concupiscência dos olhos" (1 Jo 2.16). Dentro desse fenômeno, deve registrar a importância exagerada ligada a tudo o que é sentido. Os cultos das igrejas são organizadas como se fossem um espetáculo para gratificar os sensorial. A música, a atmosfera de humor, o discurso agradável etc. É um cenário ideal para excitar os sentidos e preparar o público para assistir qualquer "sinal" ou "milagre", como por exemplo, uma suposta "cura". Enquanto isso, a necessidade da fé vai diminuindo. Quanto mais se depende dos sinais externos, menos se depende da fé. Quanto mais valor se dá aos dons, menos a Palavra é valorizada. Mas o que o Senhor nos diz é "... que creiamos em o nome de seu Filho, Jesus Cristo, e nos amemos uns aos outros, segundo o mandamento que nos ordenou" (1 Jo 3.23).
Antes de pedir sinais, antes de exibir os dons, antes de gloriarmos em milagres, estejamos certos de que nossa fé pode ser muito bem sustentada sem todas essas “ajudas”. Estejamos seguros de que a Palavra de Deus, a Escritura, é suficiente para mantermos fiéis ao Senhor, cheio de amor e gratidão por sua obra de redenção.
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Tradução: Heitor Alves
Sobre o autor: Ricardo Cerni Bisbal é pastor reformado e coordenador da Fundación Editorial de Literatura Reformada (FELiRe). Conheça a FELiRe pelo site www.felire.com.
Fonte: Este artigo é um epílogo do livro El Movimiento Carismático da editora FELiRe.
Extraído do site: http://www.eleitosdedeus.org
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