quarta-feira, 1 de setembro de 2010

Somos Protestantes, Sim ou Não?

Quando, porém, Cefas veio a Antioquia, resisti -lhe face a face, porque se tornara repreensível. Com efeito, antes de chegarem alguns da parte de Tiago, comia com os gentios; quando, porém, chegaram, afastou-se e, por fim, veio a apartar -se, temendo os da circuncisão. E também os demais judeus dissimularam com ele, a ponto de o próprio Barnabé ter-se deixado levar pela dissimulação deles. Quando, porém, vi que não procediam corretamente segundo a verdade do evangelho, disse a Cefas, na presença de todos: se, sendo tu judeu, vives como gentio e não como judeu, por que obrigas os gentios a viverem como judeus? Nós, judeus por natureza e não pecadores dentre os gentios, sabendo, contudo, que o homem não é justificado por obras da lei, e sim mediante a fé em Cristo Jesus, também temos crido em Cristo Jesus, para que fôssemos justificados pela fé em Cristo e não por obras da lei, pois, por obras da lei, ninguém será justificado. (Gálatas 2:11-16)
A cada dia que passa, aumentam as minhas dificuldades em ligar as igrejas ditas "evangélicas" à teologia e a tradição da Reforma Protestante. Gradualmente, os evangélicos abandonam as bandeiras do protestantismo e abraçam posturas mais próprias do catolicismo ou do paganismo. E uma delas é exatamente a bandeira do "protesto".

A metáfora do cristão como "ovelha" parece ter entrado de modo tão forte na cabeça dos evangélicos que hoje não há mais questionamentos, atitudes de repúdio ou oposição às atitudes dos líderes. Qualquer crítica é apontada como pecado de desobediência, insubmissão ou "falta de companheirismo cristão". Aos membros (ovelhas) cabe apenas o papel de dar o amém (bééé) mesmo quando a ordem de comando é o rosnar de um lobo.

Na verdade, tanta passividade não é fruto de corações obedientes ao chamado de Cristo para o Seu rebanho. Lembra mais a figura de pessoas que tapam os olhos e ouvidos e calam a boca, dando assim o seu aval para que o pecado destrúa e dizime as igrejas.

O exemplo de Paulo
Mas, quando protestar? E como fazer isso? Creio que o relato de Paulo em Gálatas 2:11-16 nos ajuda a enxergar as respostas.

Em primeiro lugar, sempre que o Evangelho for colocado em perigo o dever dos cristãos é o protesto. A carta aos gálatas foi escrita pelo apóstolo Paulo com o objetivo de combater o ensino herético de que é preciso guardar a Lei de Moisés e se circuncidar para ser salvo. Caso essa heresia prevalecesse, o Evangelho perderia a sua razão de ser, pois o sacrifício de Jesus não seria 100% eficaz para produzir a salvação. Nestas situações, ser obediente a Deus é saber reconhecer o rosnar lupino e resistir.

Em segundo lugar, sempre que a conduta dos líderes puder trazer prejuízos ao Evangelho, o líder deve ser repreendido, independente de quem ele seja. A piedade ou o título eclesiástico de um líder não são imunidades contra as críticas da igreja. Ainda que seja o próprio apóstolo Pedro. Pedro não disse nada a favor do partido que era pró-circuncisão, mas suas atitudes davam a entender que ele os apoiava. Quando um grupo de judeus de Jerusalém chegou às igrejas da Galácia, Pedro afastou-se dos gentios. Parou de apoiar, publicamente, o grupo que tinha a razão, talvez até por motivos nobres, como preservar a unidade da Igreja ou evitar a criação de atritos. Mas, como o afastamento enfraquecia a defesa da verdade, Paulo repreendeu a Pedro. Publicamente! Sem conversas prévias! A paz, a unidade e até mesmo a hierarquia não estão acima da defesa do Evangelho.

Em terceiro lugar, o erro público de um líder deve sim ser questionado publicamente. De fato, o cristão não deve expor, desnecessariamente, a vida de ninguém. Por isso os erros privados devem, sempre que possível, serem tratados reservadamente. Contudo, o erro público precisa ser punido publicamente. Principalmente quando ele é cometido por um líder, porque a sua conduta influencia a outros. Ao repreender a Pedro, Paulo apenas cumpriu o que ele mesmo ensinou depois, em 1 Timóteo 5:19-20.
Não aceites denúncia contra presbítero, senão exclusivamente sob o depoimento de duas ou três testemunhas. Quanto aos que vivem no pecado, repreende-os na presença de todos, para que também os demais temam.
Por causa de sua posição, o erro de um líder é mais danoso sim que o erro de um fiel. Por que então o fiel, quando disciplinado, é punido com rigor e o erro dos líderes não pode sequer ser apontado?

Ignorantes da própria história
Além de ser antibíblico, o silêncio dos fiéis diante dos erros de seus líderes é uma prova de amnésia evangelica. Os protestantes foram assim chamados exatamente porque lutaram contra a corrupção teológica e moral do catolicismo romano de seus dias. Os reformadores não "guardaram para si" a sua opinião nem buscaram audiências papais antes de questionarem, publicamente, o que viam. O amor pela verdade bíblica foi maior que o respeito à hierarquia clerical. Uma hierarquia que não é bíblica, diga-se de passagem.

Se o erro do pastor, do bispo, do apóstolo não pode ser apontado, se não há confrontação pública de posicionamentos errôneos, então estamos apenas reproduzindo o clericalismo católico-romano. Se os fiéis não podem protestar quando suas lideranças erram, nem questionar suas posturas e decisões, se não há debate entre ovelhas e pastores, se é uma ofensa se opor ao pastor...então, não temos moral para, por exemplo, censurarmos os católicos quando protegem padres pedófilos. Na prática, estamos fazendo o mesmo, protegendo líderes que erram.

E, se essa mensagem parece um libelo à desobediência eclesiástica, então, pare de identificar-se com Lutero, Calvino e os reformadores. Sem protesto, não haveria Reforma. Sem protesto, a Reforma não se mantém. E, sem "profecia", o povo se corrompe (Provérbios 29:18).

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