segunda-feira, 30 de agosto de 2010

Tradicionalmente Morto

O tradicional é o novo reformado. Os dois andaram juntos por um tempo, de modo que, agora um passou a engolir o outro. Por um lado, algumas igrejas sacramentalizaram a tradição e “devoraram”, no linguajar schaefferiano, a perspectiva reformada. No outro sentido, igrejas consideradas reformadas abriram mão da tradição em nome da relevância.

Pretendo, por ora, dar mais atenção ao primeiro fenômeno. Não há dúvidas que existem as igrejas reformadas que abandonaram a tradição, e perderam muito do que as definia. Há igrejas herdeiras da reforma que hoje são o pentecostalismo clássico em flor. Há igrejas que nasceram da fé calvinista e hoje bebem nas cisternas rotas de movimentos de crescimento de igreja e técnicas contemporâneas da busca de “relevância”. Há, ainda, os supostos reformados que deixaram o modelo puritano de vida com Deus, e abraçaram a espiritualidade medieval, talvez tentando colocar Calvino de mãos dadas com Teresa d'Ávila ou São João da Cruz. Sim, estes exemplares estão entre nós, mas pela maior facilidade de identificá-los, creio que não produzem tanta confusão quanto o outro exemplo.

Muitas são as igrejas que caminhavam bem no sentido de manter a perspectiva reformada com a tradição. No entanto, pouco a pouco, a tradição foi ganhando lugar, e a reforma, perdendo. A centralidade da cruz foi cedendo espaço para uma liturgia organizada, uma música constante, usos e costumes semelhantes, a comodidade de uma igreja na qual tudo permanece intacto.

Para estas comunidades, ainda resta o nome “reformado” - eles ainda conseguem falar os cinco pontos do calvinismo e mencionar alguma coisa sobre a predestinção. Mas não trabalham em termos de uma cosmovisão reformada. Rejeitaram o Ecclesia Reformata et Semper Reformanda Est (Igreja Reformada e sempre se reformando), e simplesmente se tornaram uma comunidade parada no meio da cidade. Confundiram a estética do conservadorismo com o conteúdo nele proposto, e ficaram apenas com a “carcaça”.

Nessas igrejas se percebe uma pregação vazia – como sempre, e isso conforta os membros –, disposições fracas na interação com a cultura, manutenção da membresia mais por meio da troca de favores do que pelo pastoreio efetivo, vidas sem paixão: por Deus, Pela Palavra, pelos perdidos...
Muitos reformados, pelo simples fato de tais igrejas não terem aderido ao pentecostalismo, não observam o perigo deste desvio para a igreja. O moralismo do púlpito, que há muito esqueceu o evangelho, vai matando em doses homeopáticas as ovelhas. Pior, transformando os cadáveres em réplicas nefastas a reproduzir tal mentalidade.

Com isso os pais vão perdendo seus filhos para a cultura. Lá a pressão é menor, e existe uma sensação de amor mais real. Os que ficam, trabalham a partir de uma dicotomia de vida que os faz agir de um modo na igreja, e de outro completamente diverso na cultura (trabalho, escola, faculdade, etc.).
As crianças são ensinadas, mas não educadas. Não conseguem articular as diferenças entre uma igreja parada e uma realidade dinâmica. E seguem criando problemas para os professores de escola dominical.

Os pais continuam naquele grupo de casais que funciona há uns 20 anos e nunca produziu frutos. O casamento tem os mesmos problemas, a vida continua do mesmo jeito, mas, no fim das contas, esta regularidade é boa. Quem está preocupado com frutos, afinal? Eles só vão gerar mais problemas para administrar...

A igreja pode ostentar um grande prédio, vários anos nas costas, e um orçamento consideravelmente bom. Mas ali está um cemitério do Evangelho. Nada há de perspectiva reformada, realmente. Apenas os restos do que um dia foi uma comunidade viva.

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